Hoje é o dia dos professores. Se eu acertasse fazer selfie, buscava uma maçã ( que há muito tempo distanciou-se de Eva e aproximou-se da professora), fazia uma e dedicava à essa classe. Inábil, abraço os profissionais, a quem todos nós somos devedores eternos, relacionando minhas irmãs Nalize, Leda e Iracema, minha sobrinha Sandra, meu primo Júlio Valença, Dona Elita que me ensinou a ler, Oswaldo Ferreira, Ladjane Duarte e Enéas ... carinho imenso por vocês.
Ao longo dos dias de hoje e amanhã, vou colocando aqui boas e inspiradoras histórias. Coloco não para que os professores vejam, mas para que todos os demais entendam que sem eles, não adianta prometer mundos e fundos. Sem, educação... nada acontece.
São Paulo – Em sua sala, o diretor da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Infante Dom Henrique, Claudio Marques da Silva, mostra a lista dos livros mais vendidos em sebos pelo Brasil. Em primeiro lugar, está “Quarto de Despejo”, de Carolina Maria de Jesus. Ele comenta com satisfação a nova popularidade da escritora que, em breve, dará seu nome à escola da Zona Norte da capital paulista.
A mudança faz sentido. Carolina de Jesus, considerada a primeira escritora negra do Brasil, viveu na Favela do Canindé, onde, nos anos 1950, escreveu seu livro a alguns quarteirões da Emef Infante Dom Henrique.
Muitos alunos vivem na comunidade remanescente da antiga favela. E, assim como a escritora – que nasceu em Sacramento (MG) e migrou para São Paulo – nasceram em outros estados ou países antes de chegarem ali. Na instituição, 20% do corpo discente é imigrante ou descendente de sírios, peruanos, angolanos ou, em sua maioria, bolivianos.
A escola e os professores se esforçam para que o ambiente seja inclusivo para todos os alunos. Mesmo assim, nas aulas de história, a professora Rosely Marchetti Honório notou que, ao tratar de migração e trabalho escravo, surgiam comentários dirigidos aos estudantes migrantes por colegas da sala que eram influenciados por preconceitos.
Da necessidade de fazer um debate mais profundo sobre imigração, nasceu o projeto que rendeu a Rosely um lugar entre os 10 finalistas do prêmio Educador Nota 10 de 2017. A professora tomou cuidado para que o projeto estivesse relacionado ao trabalho escravo, considerando o contexto da escola e do bairro, onde fica um dos maiores pólos da indústria têxtil do Brasil.
O migrante mora em minha casa
Rosely se lembra claramente de dois professores de Língua Portuguesa que influenciaram sua vida profissional. Ambos tinham uma característica em comum: sempre ouviam seus alunos. Para ela, no momento em que o professor se abre para contar sua história, ele dá maior significado para suas experiências, e abre o caminho para que os alunos também compartilhem as suas.
Quando chegou à Emef Infante Dom Henrique, em 2016, a primeira coisa que a historiadora fez foi se aproximar e conversar com seus novos alunos. A ligação criada no início culminou no projeto finalista do Educador Nota 10, em que a professora relaciona fortemente à história do bairro do Canindé com a realidade de seus alunos.
Em um primeiro momento, os alunos fizeram desenhos com o tema “família”, usados para uma roda de conversa em que a professora pediu para identificarem se havia migrantes representados ali. Depois, fizeram suas árvores genealógicas e entrevistaram um membro da família. “Muitos pensavam que migrante é apenas quem vem de outro país. Com isso, viram que a migração é uma característica de toda a comunidade humana e está presente em todas as famílias”, conta Rosely.
Lucas Araujo Silva, de 13 anos, se surpreendeu ao descobrir que tinha ascendência alemã por parte do pai e indígena pela mãe, ambos vindos do nordeste. “As pessoas sofrem com o preconceito e o racismo por virem de outra região. Temos que tratar os imigrantes bem, todos merecem um espaço”, disse o aluno.
Porta da coordenação: 4 línguas |
A partir das primeiras atividades, a professora usou filmes, contos e fotografias para explicar os conceitos de preconceito, discriminação e racismo. Com a discussão sobre a mudança de nome da escola, Rosely aproveitou para usar Carolina de Jesus para fazer um paralelo entre a história da região e a da mulher, que migrou de Minas Gerais, lutou contra a pobreza e conseguiu realizar seu sonho de se tornar escritora.
Usando depoimentos de trabalhadores libertados do trabalho escravo e documentários sobre a precarização do trabalho em confecções, a historiadora trouxe o tema cada vez mais próximo da realidade dos alunos. Tão próximo que eles ficaram chocados ao descobrir que podiam encontrar pela região duas confecções que haviam sido denunciadas por precarização do trabalho pelo Ministério Público do Trabalho.
Eles partiram, então, para a parte final do projeto: uma intervenção. As turmas criaram panfletos informativos sobre como identificar e denunciar o trabalho escravo, que distribuíram pelo bairro, em comércios e para ambulantes. Rosely ficou muito satisfeita com a participação dos alunos, comprometidos em espalhar o que aprenderam no projeto. Na sala de aula, o principal resultado foi a melhora na relação entre os colegas, com mais integração e respeito.
“A educação é muita vontade, empenho e conhecimento. O resumo de tudo isso é a competência. E a Rosely sintetiza tudo isso”, elogia o diretor Claudio Marques da Silva.
O projeto está se repetindo este ano com duas novas turmas e a professora já inspirou um projeto extra vindo dos alunos. Mariana Victória Calle Quispe, de 12 anos, notou que muitos imigrantes ficavam isolados em seus próprios grupos e pensou numa solução: “Tive a ideia com uma amiga e fomos falar com a professora Rosely. Queríamos fazer um projeto para falar da nossa cultura e ensinar espanhol”, conta a aluna de família boliviana.
Fonte: Revista Exame 16.10.2017
Nota: a referida escola que fica no bairro de Pari, continua com o nome de Infante Dom Henrique.
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