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Mostrando postagens com o rótulo Envelhecimento

Humor: As 4 Idades do Natal

 

A Nova Casa, crônica de Carlos Eduardo Novaes

Meu amigo Luiz está se mudando. Mês que vem deixa a casa dos 70 e de mala e cuia se muda para a casa dos 80. Luiz pretende viver uns bons anos na nova casa, mais próxima do fim da rua. Ele sabe que estou morando lá há mais de dois anos e perguntou-me se gostei da mudança. Ora, não se tratou de gostar ou não. Terminou meu tempo na casa dos 70 depois de 10 anos, e saí feliz porque podia ter sido despejado antes do final do contrato. Assim como a casa dos 20 lembra uma universidade, a casa dos 60, um posto do INSS, a casa dos 80 lembra uma clínica geriátrica. Lembrava! Quando entrei na casa a primeira surpresa foi vê-la cheia de “cabeças brancas”. Na época da minha avó alcançar a casa dos 80 era uma façanha olímpica, para poucos. A segunda e maior surpresa foi ver a “rapaziada”, pulando, malhando, correndo, namorando, como se não houvesse amanhã.  De uns anos para cá a casa dos 80 foi aumentada com vários puxadinhos, para abrigar tanta gente. E não é só! Da minha janela vejo que estã...

O Avô Tem Uma Borracha na Cabeça, Rui Zink

(...) Só havia um problema com o avô. Por vezes esquecia coisas A princípio, não era nada de mais. Depois comecei a dar conta Coisas pequenas, a princípio. "Onde ficou o raio do lápis?" "Onde pus a chata da caneta?" "Mas onde diabos deixei eu a caneta?" Uma vez o avô enganou-se na rua. Outra vez, enganou-se no meu nome. Outra vez, o avô de esqueceu-se do caminho para casa. Fui eu que tive de o levar. Até que um dia perguntei: "O que tem o avô?" Os meus pais hesitavam em dizer. Não era por mal. Os crescidos nem sempre sabem o que dizer a uma criança. E acabei por ser eu a responder: " O avô tem uma borracha na cabeça!" (...) As borrachas apagam coisas E a cabeça do meu avô apagava coisas. As coisas dele. A vida dele. A ele. A nós. (...) Eu não podia deixar isso acontecer. Eu precisava de fazer alguma coisa. E foi então que tive uma ideia. Trabalhei a noite toda com afinco. No dia seguinte, os meus pais ficaram surpreendidos por me verem...

Melhor Idade É A Puta Que Te Pariu, Ruy Castro

Melhor idade é a puta que te pariu – a melhor idade é de 18 aos 40 anos… A voz em Congonhas anunciou: "Clientes com necessidades especiais, crianças de colo, melhor idade, gestantes e portadores do cartão tal terão preferência etc.". Num rápido exercício intelectual, concluí que, não tendo necessidades especiais, nem sendo criança de colo, gestante ou portador do dito cartão, só me restava a "melhor idade" – algo entre os 60 anos e a proximidade da morte. Para os que ainda não chegaram a ela, "melhor idade" é quando você pensa duas vezes antes de se abaixar para pegar o lápis que deixou cair e, se ninguém estiver olhando, chuta-o para debaixo da mesa. Ou, tendo atravessado a rua fora da faixa, arrepende-se no meio do caminho porque o sinal abriu e agora terá de correr para salvar a vida. Ou quando o singelo ato de dar o laço no pé esquerdo do sapato equivale, segundo o João Ubaldo Ribeiro, a uma modalidade olímpica. Privilégios da "melhor idade" ...

Tempo Que Passa, Inez Cabral

Anteontem eu tinha dezoito anos. Levei dezoito anos para chegar lá. Pisquei, já tinha trinta. Me assustei um pouco, meus filhos cresciam, mas eram crianças. Fui dormir, acordei usando henna, mais por estética do que para esconder meus cabelos grisalhos. Achei bom, sempre quis ter cabelo colorido. Gostaria de azul marinho, mas no meu tempo isso não existia. Tive que entrar na henna mesmo. Daí, pisquei de novo, e ao me olhar no espelho, meu cabelo estava da cor das labaredas do inferno. Cruzes! Me identifiquei com uma vizinha, recalcada e cruel. Pensei com meus botões: “Não quero ficar assim, vou assumir a minha cor natural.” como se cor de cabelo definisse a pessoa. Não me arrependo, acho que fiquei bem com meu cabelo prateado. Por dentro me sentia igual, achava estranho as pessoas me chamarem de senhora. Sou sedentária de nascença, na escola menstruava quatro vezes ao mês, só para ser dispensada das aulas de ginástica. Um dia em que não pude escapar da tortura, era dia de basquete...

Não Entre Na Noite Pra Se Render, Dylan Thomas

Não entre na noite pra se render Imagem: Regina Porto Velhice é pra arder até o fim, Lute, lute para a luz não morrer. O sábio aceita bem o escurecer Mas tem palavras de luz e por fim Não entra na noite pra se render. O justo, que ao partir irá sofrer Porque não lhe coube um melhor jardim, Luta, luta para a luz não morrer. O rude que põe o sol pra correr, E vê tarde demais o que é ruim, Não entra na noite pra se render. O sério, ao pé da morte, já sem ver, Acesos os olhos, alegre enfim, Luta, luta para a luz não morrer. E você meu pai, triste de se ver, Amaldiçoe, abençoe-me assim. Não entre na noite pra se render, Lute, lute para a luz não morrer. De: Do not go gentle into that good nigth. Tradução; Jorge Pontual Dylan Thomas era um escritor inglês, leia aqui sobre ele.

Envelheci, Regina Porto

     Minhas mãos não são delicadas e, neste momento, nem pintei as unhas.     Olhando para elas vejo manchas que chamo de sardas para creditar ao castigo do sol sobre a pele muito branquinha, a inexorável passagem do tempo. Envelheci.     Aos vinte anos, quando tudo era bonito, inclusive as mãos, fazer 50 era tão distante até parecia jamais chegar.. Chegou. Passou e é bom.      Para minha surpresa não detesto ter envelhecido. Deixar de por rímel porque tenho de tirar os óculos e, tirando, não enxergo meus cílios; ter de esquecer umas roupas que me caiam tão bem, porque a barriguinha resiste bravamente; fios brancos em meus cabelos e a imensa dificuldade de lembrar o nome daquele ator, que fez não sei qual filme com aquela atriz bonita... Nada disso incomoda.     A gente envelhece aos poucos que é para, tanto quanto possível, adaptar a mente à casa e a vida.    O rímel não me faz ...

Crônica cantada: Sentir-se jovem , Juca Chaves

A Arte de Ser Velho, Vinicius de Moraes

      É curioso como, com o avançar dos anos e o aproximar da morte, vão os homens fechando portas atrás de si, numa espécie de pudor de que o vejam enfrentar a velhice que se aproxima. Pelo menos entre nós, latinos da América, e sobretudo, do Brasil. E talvez seja melhor assim; pois se esse sentimento nos subtrai em vida, no sentido de seu aproveitamento no tempo, evita-nos incorrer em desfrutes de que não está isenta, por exemplo, a ancianidade entre alguns povos europeus e de alhures.      Não estou querendo dizer com isso que todos os nossos velhinhos sejam nenhuma flor que se cheire. Temo-los tão pilantras como não importa onde, e com a agravante de praticarem seus malfeitos com menos ingenuidade. Mas, como coletividade, não há dúvida que os velhinhos brasileiros têm mais compostura que a maioria da velhorra internacional (tirante, é claro, a China), embora entreguem mais depressa a rapadura.      Talvez nem s...