Os cravos portugueses Sagraram-se Pelo sangue derramado De negros e alvos. Os cravos, o povo português Os porta à mão como quem empunha um fuzil. E ao cravá-los na lapela, Pulsa-lhes um segundo coração. Os cravos portugueses São perfumados e encarnados De hastes altas, altivos mastros. Na primavera suas pétalas São jorros rubros de vinho. Os cravos dessa terra. O povo os semeia, os cultiva, Os celebra. No 25 de abril, Os portugueses adquirem cravos Como quem compra pão. Carregam cravos e desbravam trevas, As mãos seguram cravos como quem conduz Tochas de fogo e luz. Portugal que criou a ciência dos mares, Vê Lisboa alagada pela esperança, Vê, novamente, nos punhos cerrados do povo A bravura de quem venceu a fúria dos oceanos, E a selvageria dos tiranos. Os opressores argumentam, – Os tempos são outros. E para ter, eternamente, Os trabalhadores como escravos, Alardeiam: os cravos de Abril Murcharam, para sempre, irremediavelmente… Esquecem que eles, São viçosos, teimosos e persistentes
Bate o luar pelas encostas, Banha vales e grotões. Que noite clara e comprida! Entro no atalho da vida Com um grande saco nas costas, Cheio de recordações. A luz do luar, de mansinho. As sombras da noite espanta: Quem canta encurta caminho, Mata saudades quem canta. Pesa-me êste desalento Que a alma me aperta e espezinha "Caminha!" - murmura o vento, Dizem as nuvens: "Caminha!..." Vem do silêncio das matas Rumor de fonte e cachoeira. Cantam minhas alparcatas Cantando a canção da poeira. Tudo canta! A flor do mato, Uma ave noturna, um grilo Canta o veio do regato, Canta o luar no céu tranquilo. Canta o bacurau na serra, Canta o sapo na lagoa. Sobe do hálito da terra O canto da vida boa. Tanto amor! Tanta promessa Nesta vida em que definho!... E eu vou cantando baixinho... Quem canta chega depressa, Quem canta encurta caminho. Em Toda Uma Vida de Poesia vol.2 Ed.José Olympio 1957, págs.535-536 Nota: o blog manteve a ortografia original Imagem: Pixabay