Arroz, feijão, mexido de ovo e farofa de torresmo. Tudo misturado, amassado. Isso era feito dia após dia, sempre nos mesmos velhos e descascados pratos de ágate. Cada neto era servido com esse manjar dos deuses, carinhosamente temperado de generosidade, doação, amor. A avó compactava a comida no círculo central de cada prato, borrifava algumas gotas de limão-cravo, e com a lateral do garfo fazia uma cruz no centro, dividindo a porção em quatro partes. Dizia que cada parte era dedicada a um dos quatro grandes amores da vida: mãe, pai, avó e avô. E, comprometidos com esses amores, cada um de nós escolhia a parte mais amada para iniciar a refeição. Quase sempre a sequência lógica prevalecia: mãe, pai, avó e avô. Raras vezes essa harmonia era quebrada, e quando isso acontecia nem precisava investigar: havia uma surra atrelada a isso. Uma surra dada ou uma surra prometida. Se bem que isso era muito particular. Se havia alguma inversão, ninguém comentava. Acontecia dentro ...