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Mostrando postagens com o rótulo chuva

Vamos pensar? (18)

Será que às vezes o melhor não é se deixar molhar?  

Gato na Noite, poema de Alceu Valença

Sou como um gato na noite. Ah, meus olhos de vigia! Se choram de madrugada, Deságuam no meio dia E o coração se incendeia, No leito das minhas veias, Chuva de olho é sangria. Se eu cruzasse a madrugada Sem pensar no outro dia, Sem fazer acrobacias Pra me equilibrar no tempo... Se girasse um cata-vento Eu mudava a geografia, Meus olhos de vigia Enxergam não podem nada E o coração seca em água Chuva de olho é sangria Em: O Poeta da Madrugada, Alceu Valença, Chiado Editora, 2015, pág.35

Chove. Há Silêncio, Fernando Pessoa

Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva Não faz ruído senão com sossego. Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva Do que não sabe, o sentimento é cego. Chove. Meu ser (quem sou) renego... Tão calma é a chuva que se solta no ar (Nem parece de nuvens) que parece Que não é chuva, mas um sussurrar Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece. Chove. Nada apetece... Não paira vento, não há céu que eu sinta. Chove longínqua e indistintamente, Como uma coisa certa que nos minta, Como um grande desejo que nos mente. Chove. Nada em mim sente... Em: Cancioneiro Imagem

Quando Chove, Frederico Barbosa

Em São Paulo, quando                         chove, chovem carros.                          Tudo para: pontes, viadutos, Marginais. E a água retoma seu curso original: Anhangabaú, Sumaré, Pacaembu.                          Ruas onde eram rios, ex-rios, caminhos de rato, canais. Rios sobre ruas, Avenida do Estado, Via Dutra, Radial. Em São Paulo, quando chove, chovem apocalipses de quintal. Imagem: Nelson Antoini www.noticias.r7.com

Caso Pluvioso, Carlos Drummond de Andrade

A chuva me irritava. Até que um dia descobri que Maria é que chovia. A chuva era Maria. E cada pingo de Maria ensopava o meu domingo. E meus ossos molhando, me deixava como terra que a chuva lavra e lava. Eu era todo barro, sem verdura... Maria, chuvosíssima criatura! Ela chovia em mim, em cada gesto, pensamento, desejo, sono, e o resto. Era chuva fininha e chuva grossa, matinal e noturna, ativa... Nossa! Não me chovas, Maria, mais que o justo chuvisco de um momento, apenas susto. Não me inundes de teu líquido plasma, não sejas tão aquático fantasma! Eu lhe dizia em vão - pois que Maria quanto mais eu rogava, mais chovia. E chuveirando atroz em meu caminho, o deixava banhado em triste vinho, que não aquece, pois água de chuva mosto é de cinza, não de boa uva. Chuvadeira Maria, chuvadonha, chuvinhenta, chuvil, pluvimedonha! Eu lhe gritava: Pára! e ela chovendo, poças d'água gelada ia tecendo. Choveu tanto Maria em minha casa que a correnteza forte criou asa e um rio se formou...

Enquanto Chove e a Noite é Triste, Austro Costa

- Ter alguém junto a mim, nesta noite tão fria! Exclamo, e fico a espiar, através da vidraça, a rua, agora tão deserta e sem poesia, a rua, ao Luar vazia, onde somente cai a chuva, e ninguém passa... Ah, ter alguém aqui, mas, alguém que reunisse ao Mistério a ternura amorável! Aquela... Aquela que eu não sei se é Dulce, ou Alda, ou Alice, porém cuja meiguice há de o estilo possuir das lindas cartas dela! ... E ela é apenas Mistério. Ama-me, e tem receio de que eu lhe saiba o nome! E nem vem ... Mas, virá? Sonho-a, entanto, imagino-a aqui junto ao meu seio, lendo os poemas que eu leio ou traduzindo, ao piano, uns motivos de Bach. Sinto-lhe a mão macia em meu ombro. Tão leve!... Ouço-lhe a doce voz, feita de suaves trenos. Olho-a e sinto que a mão não a pinta  ou descreve: Ela é a Branca de Neve que eu apero, final, nos meus braços morenos. Sonho-a apenas, entanto. Ela não vem agora... E eu - tão feliz na  minha ingênua Fantasia! -Sim; alguém há de ...

São José, rogai por nós. Cícero Belmar.

Por ser 19 de março, tenho a sensação de que é um dia diferente. Posso refazer a frase? Tenho certeza de que é um dia especial por ser dedicado a São José, padroeiro de Bodocó, minha cidade. Melhor dizendo, padroeiro dos sertões. Quando eu era criança acreditava piamente, assim como todo povo do Sertão, que o marceneiro esposo da Virgem Maria eram quem derramava as bênçãos divinas em forma de chuva naquele chão semiárido. Seguíamos em procissão. Contritos, sob o sol. Mandacarus de braços erguidos. Nós, diante do Divino, olhos para o chão. Quem éramos? Muitos anos passaram e eu deixei de pensar como criança. Mudei, desacreditei naquela crendice ingênua. Estudei, aprendi algumas coisas. Li a filosofia, a psicanálise, a teologia. Fui existencialista. Neguei o que aprendi no passado. Mas o tempo não para, disse Cazuza. Não para mesmo. Descobri que li erradamente muitos livros. De filosofia, de psicanálise, de teologia. Tive a graça e o tempo de reapr...

Lygia,Marcelo Diniz

Não, Lygia, a chuva não é triste. Se tanto agrada a vista avulsa, nunca pense ser, Lygia, a chuva um filme mudo em que se assiste à demora do que persiste, nem metáfora mais difusa do que a própria chuva, profusa, cabendo-se no que consiste. Não são tristes, não são aflitas, nem mais nem menos que você, Lygia, as gotas que você fita esgotam-se no que se vê: sem lágrimas por ser finita, Lygia, a chuva não se entrelê. (De: Trecho, Marcelo Diniz, ed. Aeroplano

Último Abraço, Antônio Marinho do Nascimento

Dormia eu tranquilamente ou cochilava Mas em meu sono algum ruído abriu um corte Alguém batia em minha porta, alguém chamava Noite chuvosa, hora avançada, alguém sem sorte. Alguém que o sangue pelo frio já congelava Algum boêmio cuja vida não deu porte Abri a porta a até pensei que ali sonhava Quando escutei: - olá amigo, eu sou a morte. Somente isso ela me disse e já entrou Como que ali já residia me beijou Me aconchegando no calor do seu abraço Adormeci e a minh’alma em outros vales Fora do corpo que acarreta tantos males Aliviou-se sem a cruz do meu cansaço _____________________________________________________________________________ Sobre o autor :É natural de São José do Egito, terra da poesia. Fruto de uma família de tradição poética, é filho de Zeto e Bia Marinho, neto de Lourival Batista, bisneto de Antonio Marinho, sobrinho de Otacílio e Dimas Batista, de Graça Nascimento e de Job Patriota (por emoção). Nasceu em 1987....

Solidão - Josué Araujo

Solidão Josué Araujo Quando sentir-se só, dentro do quarto, E você olhar pela janela aberta, Lá fora, ainda a chuva torrente e esperta, E n’alma sentindo dores de parto; E quando você, olhando para cima, Sentir-se que está porventura cético, Do nosso Criador já quase hipotético, Levando a vida sem nada de rima; E quando ainda, mesmo que só contigo, Não se lembrar d’um bom amigo antigo, E se temer o abismo da paixão; Também se a tua voz ficar abafada, Presa na tua garganta sufocada, Sim! Isto sim! Isto é que é solidão. De Josué Araujo: O Mistério da Bruxa de Areia Dourada