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Mostrando postagens com o rótulo novos autores

Meu Nome É Carolina, conto de Natascha Duarte

      A festa junina da escola é um acontecimento esperado por todos, o ano inteiro. Cada membro da organização da festa recebe uma tarefa planejada e cumprida com rigor. Da parte alimentar, cuida dona Olinda, a merendeira que há 30 anos trabalha na escola; da música, o locutor da Prefeitura que nas horas vagas faz bicos como DJ; da coreografia, a professora de Artes, Isabela; e a João, o diretor, cabe punir exemplar mente os alunos do primeiro ao quinto ano que faltem aos ensaios da quadrilha. Aninha está já na sexta série. Para ela, portanto, é facultativo participar da dança. Para os menores, porém, a atração é uma sugestão imperiosa, senão a festa dei xa de existir. Ora, basta os que não a frequentam por razões religiosas se juntarem aos queixosos de plantão, aqueles que reclamam do preço, da hora, do dia, da indumentária, das músicas, etc., que a festa desaparece do mapa num estalo de traque. Com vontade de correr para adiantar o tempo, a menina chega à...

Somos a Geração Mais Desinformada da História, texto de Suzana Valença ( Apresentando novos blogs)

Consumimos muita mídia, mas lemos pouquíssimas notícias. Passamos mais tempo consumindo mídia do que qualquer outro momento da história humana. Nunca tivemos tanto acesso à informação. Entretanto, nem sempre quantidade quer dizer qualidade. Além de que, algumas vezes, excesso de dados não facilita a comunicação, dificulta. Passamos muito tempo conectados, mas estamos lendo (ouvindo, vendo) cada vez menos notícias. Esta semana, eu estava assistindo a uma aula do professor Thomas E. Patterson. Ele mostrou uma pesquisa na qual jovens foram perguntados sobre notícias do momento. Umas das questões era “quem é o atual primeiro-ministro de Israel?”. Mesmo sendo apresentados a múltiplas alternativas, a maioria dos entrevistados não acertou a resposta. No livro We the People, Patterson explica que estamos passando muito tempo consumindo mídia, mais do que nunca. Mas que a quantidade de alternativas de conteúdo é tanta que muitos acabam não lendo, ouvindo ou assistindo notícias como antes. Por q...

O Problema é Manter Os Sonhos Cativos, Priscila Aquino

De vez em quando a gente precisa abrir as gavetas do tempo, limpar os armários da memória e arejar a alma.  Se você olhar com atenção, é bem provável que encontre, dentro de si, sonhos empoeirados, acomodados uns sobre os outros, encostados em cantos escuros de seu íntimo. Por isso, é preciso arejar.  Com o passar do tempo, algumas gavetas podem ficar emperradas pelo desuso e pelo esquecimento e acabarem aprisionando possibilidades, ou improbabilidades, que se aquietaram à espera de um momento certo que nunca chegou ou, se chegou, passou despercebido. Os pequenos sonhos são os mais fáceis de se perderem nessas gavetas, pois entram em frestas e se acomodam, esfarelam e acabam desaparecendo por completo. Se perdem com facilidade nos muitos porquês, nos severos nãos, nas amargas recusas e enferrujam, tristes, desacreditados, desesperançados.  Abrir as gavetas é olhar para dentro de si e compreender que somos mais feitos de sonhos do que imaginamos, pois são eles que nos impu...

Mulheres da Fuvest (2): Narcisa Amália (1852-1924)

Aflita Per lui solo affido sull'ali dei venti Il suon lusinghiero di garruli accenti! Deh riedi, deh riedi!... mi stinge al tuo cor E giorni beati -vivremo d'amor! Il Guarany Desde a hora fatal em que partiste, Turbou-se para mim o azul do céu! Velei-me na mantilha (1) da tristeza Como Safo na espuma do escarcéu. Até então o arcanjo da procela Não enlutara o lago das quimeras, Onde minh'alma, garça langorosa(2), Brincava à luz de etéreas primaveras. Mas um dia atraindo ao vasto peito Minha pálida fronte de criança, Murmuraste tremendo: -"Parto em breve; Mas não te aflijas, voltarei, descansa!" Ai! Que epopeia túrgida de lágrimas Na comoção daquela despedida! Eu soluçava envolta em véu de prantos: "Quando voltares", já serei sem vida! Desde então, comprimindo atrás as angústias, Vou te esperar à beira do caminho; Voltam cantando ao sol as andorinhas, Só tu não volves ao deserto ninho!... Quando a tribo inquieta das falenas (3) Liba(4) filtos nas clícias(5...

Dois Poemas de Josemári Recaldi (Peru)

Como Uma Menina Como uma menina que comtempla desde a janela do ônibus a avenida passar em sua ardente felicidade feita de amar sem nenhuma urgência eu gostaria chamar eu gostaria poder me decidir a comunicar esta estratégia de sobreviver por amor das avenidas e do mar. No Crepúsculo Pisado Descanso No crepúsculo pisado descanso, eu lírio de fome até as aréolas, Atrás de mim diga tudo o que quiser, não corro, atrás de mim eu guardo esse mesmo, murmúrio mutável de pombas. Eu para você não quero nada querer Eu em você destruo todos seus eus. Fonte: Revista Acrobata

Por Que Não Te Amaram, Francisco? crônica de Antonio Neto

O outono capixaba alterna dias ensolarados com outros nublados, atravessados por dias chuvosos, desfazendo um pouco do eterno verão que nos é peculiar. Nesses últimos dias, o mar tem nos trazido ventos tristes... Francisco é morto. Isso faz lembrar o trecho da música de Fernando Brant, Lô Borges e Márcio Borges; eternizada na voz de Milton Nascimento: “Por que você não verá Meu lado ocidental? Não precisa medo, não Não precisa da timidez Todo dia é dia de viver Eu sou da América do Sul Sei, vocês não vão saber” Jorge Mario Bergoglio nasceu em Buenos Aires, em 17 de dezembro de 1936, filho de imigrantes italianos. Quando eleito Papa, ele disse: “Parece que meus irmãos cardeais foram me buscar no fim do mundo”. Ele se declarava, assim, um homem do Sul Global. Proveniente dos países colonizados pelas nações europeias por cerca de 300 anos. Nós, a periferia do mundo. Nós somos o Extremo Ocidente, como cantou Caetano Veloso, na música Milagres do Povo: “Foi o negro que viu a crueldade bem...

Meu Nome é Meu, livro de Natascha Duarte.

  Os 18 contos deste livro não têm urgente ligação entre si, embora as personagens contem  histórias em comum. Uns contos falam de amor, outros de não amor, uns são concretos, outros mais absurdos. Aparecem mulheres solitárias, à beira da morte, em ataques de riso; homens arrependidos de rompantes da juventude, homens que se transformam em anjos. A autora posiciona os personagens como se encaixasse a tristeza sem que ela ocupasse um espaço grande demais.   “O conto é uma reserva tímida que se explorada com coragem se transforma em história” .  Natascha Duarte A editora Urutau nasceu para cantar as horas diante das páginas. Nos últimos cinco anos já publicamos mais de mil livros sem qualquer custo para os autores e as autoras. Nosso site é   www.editoraurutau.com.br     Essa pré-venda é de Natascha Duarte para a publicação do livro  " Meu nome é meu" . ____________________________  .   “O conto é uma reserva tímida que se explorada c...

Narrativas Epistolares, Alfredo Sampaio e Priscila Aquino

Uma carta para não ser lida Vitória, 15 de dezembro de 2024. Beatriz, Hoje acordei decidido. Na minha vida, há algumas pontas ainda sem os devidos nós e tirei o dia para pôr essa tarefa em dia. Resolvi te escrever uma carta que nunca vai ser lida. Isso mesmo, nunca vai ser lida, mesmo porque nunca existiu. Diante de seu silêncio e da minha inação, restou apenas registrar o que aconteceu comigo. Você sequer imagina os fatos que ocorreram e que motivaram alguns escritos, entre eles alguns miseráveis poemas e essa carta. Encantei-me com você há um certo tempo. Seus olhos e cabelos pretos, seu sorriso apertado nos lábios, um certo grau de miopia e seu jeito extremamente simples, cativante e delicado me encantaram. Foi tudo muito rápido: esse seu jeito despojado de ser e de conduzir a vida encantou-me. Você, Beatriz, irradia simpatia. Meus dias se resumem entre encontros propositalmente provocados, duas trocas de olhares e um sorriso, não mais que isso. Foi tudo que bastou: nunca conversei...

Vai Um Cafezinho Aí? texto de Priscila Aquino

O verão no Brasil não é para amadores. Em várias cidades, de Norte a Sul, os termômetros vêm esbarrando facilmente na casa dos 40 graus nesses últimos dias. Esse fato, por si só, deveria significar algumas mudanças de hábitos e comportamentos que podem amenizar o calorão que toma conta do país. Banhos frios são bem-vindos seja no mar, em piscinas, chuveiro e mesmo de mangueira; a alimentação pede cardápios mais frescos com frutas e saladas; e as roupas ganham tecidos finos e cortes mais curtos e soltos. Mas é curioso observar como o brasileiro se mantém fiel a um hábito diário que em nada ajuda a superar o calorão. O cafezinho! É como se o cafezinho fosse um símbolo de resistência, uma espécie de amor à primeira xícara que, por mais que o calor aperte, nunca deixa de ser parte da rotina do brasileiro. Essa relação que vai além da bebida, se manifesta como um vínculo emocional, cultural e quase instintivo. Um cafezinho quente pela manhã, ou um expresso depois do almoço, continuam sendo...

Prêmio São Paulo de Literatura Edição 2023: Vencedores

       Mariana Salomão Carrara  e Alexandre Alliatti foram os vencedores da última edição do Prêmio São Paulo de Literatura.       Não Fossem As Sílabas do Sábado,dela,  e Tinta Branca,dele, venceram nas categorias Melhor Romance  e Romance de Estreia respectivamente. Não Fossem As Sílabas do Sábado Mariana Salomão Carrara Ed. Todavia Ano: 2022 Págs. 168 Tinta Branca Alexandre Alliatti Ed. Patuá Ano 2022 Págs. 192

O Enterro de Maria do Cricaré, Antonio Neto

A notícia da morte de Maria do Cricaré se espalhou como fogo no mato seco por toda a São Mateus . Quem não lhe devia um favor, uma bênção, o socorro na hora do parto, uma garrafada ou mesmo sua intervenção direta perante as autoridades? Fosse pobre ou fosse rico, todo cidadão ou cidadã mateense sabia quem era Maria do Cricaré e sabia respeitar a sua presença. Embora fosse muito pobre, parecia ser uma rainha africana. A majestade estava nos seus gestos, na sua voz e nas palavras que saíam da sua boca. Mesmo as famílias mais racistas da elite mateense tratavam aquela mulher singular com o devido respeito.  Agora, com a notícia de sua morte, a cidade estava paralisada. Parecia que o sol interrompera o seu trajeto no céu e que o vento já não soprava. E, temendo que o banzo tomasse conta da população, as autoridades procuraram apressar o enterro da anciã. Procuraram saber da família. Estavam todos espalhados pelo sul da Bahia, norte de Minas e pelos arredores de Vitória. Em São Mateus s...

Tudo Nela Brilha e Queima, Ryane Leão

sou de manifestar aquilo que sinto gosto de sentimentos em ebulição e se alguém se assusta se acha absurda a urgência do afeto se vê como loucura carregar o coração também do lado de fora então que se afaste entre a expectativa e a monotonia escolho o agora. Em: Tudo Nela Brilha e Queima , poemas de luta e de amor. Ryane Leão,  Ed. Planeta 2017 pág.23

Feijão Orgânico, Ladyce West

Tenho uma amiga dedicada à produção orgânica, com fazenda no interior do estado de São Paulo. Recebi dela um quilo de feijão carioca.  “É para colocar na geladeira. Não precisa deixar de molho de véspera, basta umas duas horas antes de cozinhar. Depois, cozinha em quinze minutos.” “Você não vai acreditar na delícia que é”, interveio, uma amiga em comum que faz ioga conosco. “Mas, olha,” disse a fazendeira, “tem que catar. Porque tudo é feito à mão e vem com pedrinhas, palha, alguns elementos da terra.” Mal sabia que esta demanda iria me causar meia hora de grande prazer, e um dia repleto de memórias. Há muitos anos não cato feijão.   Encontrar ciscos foi encontrar minha avó, depois meu pai e a infância degustatória. Sentadas, na sala de jantar, o jornal do dia anterior aberto sobre a mesa, uma pilha de feijão no canto cobrindo as manchetes antigas, uma tigela para cada uma, catávamos feijão para o almoço.   Minhas mãos pequeninas, de quatro a cinco anos, selec...

Bandeira, Marcelo Valença

Minhas cores são todas E minha bandeira é o agora Da sobra dos dias À luz do crescimento Uma flâmula de todo o saber Minhas armas De criação em massa Um risco, um som e uma palavra Tremulam aos ventos do que virá Sou livre Ninguém impede meu caminhar Na minha terra livre Voa quem é de céu Reza quem é de fé Canta quem é de voz Beija quem é de lábio Dança quem é de alegria Minhas cores são todas E minha bandeira Ativa e altiva É o amor

Tudo de Bom Vai Acontecer, Sefi Atta

De início eu acreditava em tudo o que me diziam sobre bom comportamento, até mesmo em mentiras deslavadas, embora tivesse meus próprios critérios. Em uma idade na qual as outras meninas nigerianas gostavam de brincar de ten-ten - brincadeira típica em que as crianças batem com os pés no chão em movimento ritmado e tentam vencer os adversários com joelhadas inesperadas -, minha distração favorita era ficar sentada no pequeno deque e fingir que estava pescando. Mas detestava quando minha mãe gritava da janela da cozinha, "Enitan, venha me ajudar aqui". Era obrigada a voltar correndo para casa.     Nós morávamos junto à lagoa de Lagos. Nossa propriedade tinha uma área de pouco mais de mil metros quadrados, limitada por uma cerca de madeira com farpas que machucavam os dedos. Eu brincava despreocupadamente só do lado oeste do quintal, pois o leste dava para mangue do parque Ikoui, onde já vi uma cobra-d'água. Os dias eram quentes, lembro-me bem, ensolarados e com pouca brisa....