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Mostrando postagens com o rótulo Manuel António Pina

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           Gosto de fazer a retrospectiva, porque revejo postagens e comentários. Este ano, o texto de uma amiga está entre as cinco mais lidas. Fiquei feliz por ela.    Clique no título e releia.  Vale a pena. Um Cinturão , Graciliano Ramos.  7 de maio 8 Mulheres Que Brilharam e Não Podem Ser Esquecidas - 8 de março Os Tigres de Tozamurai-No-Ma , Manuel António Pina - 26 de abril Aprenda a Chamar a Polícia , Luis Fernando Veríssimo - 31 de maio Corporiedade Feminina , Janete Barros - 12 de março

O Nome do Cão, Manuel António Pina

O cão tinha um nome por que o chamávamos e por que respondia, mas qual seria o seu nome só o cão obscuramente sabia. Olhava-nos com uns olhos que havia nos seus olhos mas não se via o que ele via, nem se nos via e nos reconhecia de algum modo essencial que nos escapava ou se via o que de nós passava e não o que permanecia, o mistério que nos esclarecia. Onde nós não alcançávamos dentro de nós o cão ia. E aí adormecia dum sono sem remorsos e sem melancolia. Então sonhava o sonho sólido em que existia. E não compreendia. Um dia chamámos pelo cão e ele não estava onde sempre estivera: na sua exclusiva vida. Alguém o chamara por outro nome, um absoluto nome, de muito longe.   E o cão partira ao encontro desse nome como chegara: só. E a mãe enterrou-o sob a buganvília dizendo: “É a vida…”

Uma Prosa Sobre Meus Gatos, Manuel António Pina

Perguntaram-me um dia destes ao telefone por que não escrevia poesia (ao menos um poema) sobre os meus gatos; mas quem se interessaria pelos meus gatos, cuja única evidência é serem meus (digamos assim) e serem gatos (coisa vasta, mas que acontece a todos os da sua espécie)? Este poderia (talvez) ser um tema (talvez até um tema nobre), mas um tema não chega para um poema nem sequer para um poema sobre; porque é o poema o tema, forma apenas. Depois, os meus gatos escapam demais à poesia, ou de menos, o que vai dar ao mesmo, são muito longe ou muito perto, e o poema precisa do tempo certo de onde possa, como o gato, dar o salto; o poema que fizesse faria deles gatos abstractos, literários, gatos-palavras, desprezível comércio de que não me orgulharia (embora a eles tanto lhes desse). Por fim, não existem “os meus gatos”, existem uns tantos gatos-gatos, um gato, outro gato, outro gato, que por um expediente singular...

Os Tigres de Tozamurai-No-Ma, Manuel António Pina

Ninguém os vira antes, nem Naonobu, emboscados na matéria da madeira inexistindo puros e interiores. Capturados pela astúcia do carmim e do oiro na cerimónia da pintura correm imóveis entre as cerejeiras. Os seus olhos impacientes presos do lado de fora fitam com ira os turistas. Leia mais do mesmo autor

As Palavras, Manuel António Pina

As que procurei em vão, principalmente as que estiveram muito perto, como uma respiração, e não reconheci, ou desistiram e partiram para sempre, deixando no poema uma espécie de mágoa como uma marca de água impresente; as que (lembras-te?) não fui capaz de dizer-te nem foram capazes de dizer-me; as que calei por serem muito cedo, e as que calei por serem muito tarde, e agora, sem tempo, me ardem; as que troquei por outras (como poderei esquecê-las desprendendo-se longamente de mim?); as que perdi, verbos e substantivos de que por um momento foi feito o mundo e se foram levando o mundo. E também aquelas que ficaram, por cansaço, por inércia, por acaso, e com quem agora, como velhos amantes sem desejo, desfio memórias, as minhas últimas palavras. Fonte: Revista Piaui. Leitura recomendada: Estamos Todos No Mesmo Time