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Mostrando postagens com o rótulo sonho

Assim Começa o Livro Que Comecei

Ele veio silenciosamente. Inclinou-se sobre a minha cama. Seus dedos transparentes quase tocaram no meu ombro: "Raíza, Raíza!" Tinha uma rosa no lugar do rosto, mas o hálito adocicado era de hortelã. Papai você bebeu outra vez! Tive vontade de dizer-lhe. Foi quando senti um perfume moribundo de rosas e lembrei-me então de que ele tinha morrido. Quis abraçá-lo, paizinho, que saudade, que saudade!...      Quando ergui os braços ele já tinha desaparecido. Senti o travesseiro úmido de lágrimas. Contudo, fora um bom sonho. Aúnica coisa estranha era aquela rosa em lugar do rosto, mas assim mesmo cheguei a achar natural vê-lo com a cara desabrochada em pétalas.      Voltei-me para a porta por onde ele entrara. Estava fechada. Na escuridão do quarto, só a porta tinha o contorno marcado pela frincha de luz que se filtrava por baixo: era como a tampa do enorme caixão de um enterrado vivo, acordado com a noite ao redor. E vendo pelas frestas o sol a brilhar lá fora. ...

Érico Veríssimo e John Lennon Dois Sonhadores da Paz.

      Com enorme surpresa vi que no livro A Volta do Gato Preto (Ed. Globo, 1961, págs 154-155), ' a ideia de Érico Veríssimo é cantada por  com John Lennon.  Vejam o trecho do livro de Érico, cuja primeira edição é de 1946:      " Li num prefácio de Julien Green que os homens são palavras de uma frase cujo sentido só Deus conhece. Olhando as gentes que povoam o campus do Mills, pergunto a mim mesmo qual será o sentido desta tão estranha e variada combinação de palavras... Será apenas uma legenda ociosa escrita na superfície dum lago? Uma frase fútil atirada ao vento? Não creio. Esta sociedade heterogênea em que misturam chineses, franceses, brasileiros, guaremaltecos, salvadorenhos, mexicanos, alemães, judeus, filipinos, peruanos, chilenos, pode bem ser o símbolo do mundo do futuro,um mundo de fronteiras apagadas, sem barreiras alfandegárias, sem passaportes e sem nacionalismos agressivos - um mundo de cordialidade e compreensão. Sonho? Que outra...

Fluente, poema de Marcelo Valença

Somos feitos de ação E, mais que isso Somos feitos de ascensão Maturamos em água E, quando prontos Somos entregues à luz E ao ar Somos feitos de senso E, mais que isso Somos feitos de descenso Crescemos buscando o céu E, quando o alcançamos Forçamo-nos a descer ao chão E aterrar Somos feitos de mudança E, mais que isso Somos feitos de perseverança Tememos despregarmo-nos do tempo E, quando o fazemos Tememos retornar ao ontem E parar Somos feitos de decisão E, mais do que isso Somos feitos de contradição Explicamos os fatos e a razão Mas, ao compreendermos Deixamos espaço para a ilusão E o medo Somos feitos e pronto Mas, mais do que isso Somos refeitos ponto a ponto Cabemos em nossos sonhos E, ao sonharmos Cabemos livres em toda a terra E em todo céu. Veja mais em in.voluntaria

Historinha de Páscoa, Maria Julieta Drummond de Andrade

 Até hoje Josefina não sabe explicar se foi sonho, fantasia ou realidade. No Domingo de Ramos, depoisde almoçar  bem, com vinho chileno e um licorzinho final, deitou-se na rede da varanda, disposta a abandonar-se ao dia luminoso. A cabeça, os pensamentos iam  e vinham, no mesmo ritmo lento e oscilante da rede; as preocupações foram esmaecendo, à medida que ela se deixava embalar.       Nisso houve um barulhinho que a princípio tentou ignorar, recendo romper a lânguida quietação que a envolvia. Mas o pequeno ruido - áspero, curto, insistente - acabou invadindo-lhe o bem estar. Abriu com relutância o olho preto ( o mais esperto) e logo depois o segundo,já totalmente emersa da modorra: diante dela um coelho malhado a encarava, com a orelha direita para cima e a esquerda encolhida. Seu jeito insolente e meio c6omico não a surpreendeu,pois tudo era possível sob aquela esplêndida luminosidade de abril. O visitante parou de arranhar o mosaico com as unhas, e ...

Dois Poemas de Alejandra Pizarnik

Sonho Rebentará a ilha da lembrança A vida será um ato de candura Prisão Para os dias sem retorno Manhã Os monstros do bosque destruirão a praia sobre o vidro do mistério Manhã A carta desconhecida encontrará as mãos da alma Festa Eu desdobrei minha orfandade sobre a mesa, como um mapa. Desenhei o itinerário para meu lugar ao vento. Os que chegam não me encontram. Os que espero não existem. E bebi licores furiosos para transmutar os rostos em um anjo, em copos vazios. Saiba quem é Alejandra Pizarnik clicando aqui .  A escritora argentina tem livros editados em português e podem ser comprados na Amazon .

Pedaços de Vida Jamais Desvendados, Ignácio de Loyola Brandão

     No final dos anos 1950, em Araraquara, Mister Pimenta, professor de inglês, teve um gesto generoso.  Toda terça-feira à noite, ele dava uma aula gratuita de reforço de inglês. Classe lotada. Por semanas, lá estive, por interesse na língua e em uma loirinha, a Gilda. O ritual da paquera, na época chamado flerte, era longo, exigia paciência. Em geral, começava no footing, com as mulheres caminhando na calçada entre os dois cinemas e os homens parados no meio-fio. Olha que olha, olha que olha, até que o olhar era correspondido. O footing acontecia aos sábados e domingos. Primeira semana, segunda, terceira, um encontro era marcado e aí dependia de você. As aulas de terça-feira acabavam funcionando como um dia a mais para nos favorecer. Uma noite, consegui descer a escada ao lado de Gilda. Emocionado, sabia que aquela era a chance. Conversamos um pouco, elas tinham horário para regressar à casa, 10 da noite. A certa altura, consegui encaixar a frase, “gostaria de nam...

Sonho, Ladyce West

Sapatilha de cetim  rosa, mágica. r Nos pés da menina, flutua. Passe para o sonho, bilhete para outra vida. Ela dança esvoaça na esperança. Borboleta-menina, trêmula no desejo, pousa no palco. Vacila, hesita, titubeia, enrijece e não cai, não perde a visão do futuro do objetivo final: voar. Apoiada em sonhos, levada pelo desejo, desafia a física e os deuses. Uma chama de rebeldia, um lampejo de independência firma-se na maciez do cetim rosa inquieta.  Em: À Meia Voz , Ladyce West Imagem: Owaldo Ibañez - Unsplash

Velho Caxombo Sonhou Com O Mar, José Eduardo Agualusa

  Ataque de Quissondes – um dos laboratórios experimentais do ilustre professor Carlos Eduardo Noronha de Mello e Silva Franco, na Quissama, foi completamente devastado por um ataque de formiga vermelha. Segundo o professor Silva Franco, que se encontra em Angola ao serviço da Real Sociedade Britânica de Zoologia, os quissondes devoraram uma colecção de ofídios embalsamados que lhe haviam demorado oito anos a completar. No desastre pereceu ainda o guarda do laboratório. in “A Gazeta de Loanda” de 20 de Março 1901 Na última tarde da sua vida, quando depois do costumeiro almoço de fungi e quizaca se estendeu na esteira para gozar a sesta, o velho Caxombo sonhou com o mar. Mas ao acordar já não se lembrava disso, e mesmo que se lembrasse não teria atribuído ao facto importância alguma. Para ele, que fora criado por um branco e pensava em português, o mar era apenas o mar. Assim, e até quase à hora do sol-pôr, esse dia foi para o velho Caxombo igual a todos os outros. Já há oito anos ...

Frankenstein ou o Prometeu Moderno, Introdução da Autora

Ao escolher Frankenstein para integrar   uma de suas séries, os editores de romances clássicos expressaram o desejo de que eu lhes fornecesse algumas informações sobre as origens da história. Estou disposta a atendê-los, sobretudo porque assim posso dar uma resposta geral à pergunta que me é feita com frequência: por que eu, que era então uma moça jovem, cheguei a ter uma ideia tão terrível e a desenvolve-la? É bem verdade que não me agrada muito falar  publicamente de minha intimidade, mas já que meu relato não será mais do que um suplemento para uma produção anterior e que há de se restringir  aos tópicos que dizem respeito exclusivamente à minha posição autoral, seria talvez um exagero de minha parte considera-lo uma invasão. Não é de admirar que eu, filha de duas célebres personalidades literárias, tivesse desde muito cedo inclinações para a escrita. Já fazia minhas primeiras tentativas na infância, e meu passatempo favorito durante as horas que me eram concedida...

Felicidade No Ar, Moraes Moreira

Album:   Estados Gravadora:   Virgin Brazil Ano:   2006 Faixa:  2 - ouça aqui Desde o primeiro olhar Um forte elo entre nós Felicidade no ar Sereno, orvalho, garoa Sol da manhã notícia boa Sol da manhã notícia boa (2x) Brilha linda estrela, viva flor Seguir eu vou, seguir seu rastro Muito além está o nosso amor Além dos mapas, além dos astro La la la rarara Sempre vivi girassois,   La la la rarara Por que somos nós Somos encontro marcado As duas bandas da fruta Somos o amor sonhado O clarear da gruta Somos encontro marcado As duas bandas da fruta Somos o amor sonhado O clarear, o clarear O clarear da gruta

Encanto, Marcelo Valença

     Umas duas noites atrás choveu. Ainda tem sereno no ar quando o sol começa a nascer e o barro da estrada ainda está razoavelmente assentado. Agora bem cedo seu Ulisses está com as vacas na beira da estrada e os três me parecem contentes. Quando passo ele me acena breve com a cabeça, deixando o sorriso suave durar um pouco mais.       Já a professora Irene me encontrou mais à frente no caminho da escola, como sempre. Ela sorria também e parecia que continuava o sorriso de seu Ulisses. Como se sorrissem no gerúndio.        -Tu pensou na pergunta do consultor?      Ela me perguntou assim bem devagar. E ainda ficou parada como um mandacaru para esperar resposta.      Ora, se pensei! Claro que pensei. Estou pensando ainda agora mesmo e já pensei tanto pensamento que você nem imagina. A Irene é bem intencionada, coitada. Gostou da conversa do consultor e quer sair fazendo da esco...

7 Minutos Depois da Meia Noite - 1º capítulo

    Chamado do Monstro (trecho do primeiro capítulo)      O monstro apareceu logo depois da meia noite. Como eles sempre fazem.      Conor estava acordado quando ele apareceu.    Ele teve um pesadelo. Bom, não um pesadelo. O pesadelo. O pesadelo que ele andava tendo muito ultimamente. Aquele com a escuridão e o vento e os gritos. Aquele com as mãos escorregando, por mais que ele as tentasse segurar. Aquele que sempre terminava em... - Vá embora - sussurrou Conor para a escuridão do quarto, tentando conter o pesadelo, impedir que ele seguisse no mundo desperto. – Vá embora agora.

Pedra Filosofal, António Gedeão

Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer, como esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso em serenos sobressaltos, como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam, como estas aves que gritam em bebedeiras de azul. eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento. Eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste, capitel, arco em ogiva, vitral, pináculo de catedral, contraponto, sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista, mapa do mundo distante, rosa-dos-ventos, Infante, caravela quinhentista, que é cabo da Boa Esperança, ouro, canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e Arlequim, passarola voadora, pára-raios, locomotiva, barco de proa fe...