Os
zoológicos nunca me convenceram, nem quando eu era pequenininha. Uma
excrescência nos dias atuais, depósitos de animais ali colocados para servir
exclusivamente ao prazer que o ser humano encontra em observar o exótico, o
diferente, sem com ele se misturar, defendido, protegido e separado por cercas
e fossos. Minha última experiência do naipe remonta alguns anos, quando, por
insistência de filhos e sobrinhos, durante uma estada em São Paulo, rendi-me
aos apelos de visitar o exemplar daquela cidade, supostamente o melhor que
havia no País.
Pode até ser, mas, ainda assim, tinha um defeito grave: era
zoológico e, como tal, um museu de seres que sentem e se mexem. Jurei nunca
mais, e nunca mais mesmo.Era verão e, só para reforçar, verão paulista, que em
nada se compara ao nosso em termos de brisa. E aqui fazendo um adendo, acho uma
graça danada quando os sulistas e sudestinos ameaçam achar um absurdo que nós,
nordestinos, ousemos abrir a boca para dizer: “Ai que calor” quando lá estamos.
Outro dia, em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, quase sou linchada.
Posso jurar que nunca na vida, exceto quando tenho sonhos de cremação ou de ser
lentamente assada na fogueira, como um pernil, senti semelhante bafo.
E tome a gente a andar, eu e minha irmã fazendo a escolta, empurradas pelos gritos irritantemente felizes dos pirralhos. Devia estar na TPM, o que automaticamente me transformava também num animal, numa fera hormonal. E tome anta, cachorro-vinagre, camelo, cervo, chimpanzé e um monte de bicho que a gente procurava no mapa apenas para cumprir tabela, já que estava por ali mesmo. E foi aí que a ficha caiu, que a vida imita o zoo, ou será o contrário? Copia tal e qual a escala decrescente daqueles animais que a gente realmente deseja encontrar, daqueles que se estiver no caminho a gente até dá uma olhadinha, aqueles que francamente a gente preferia não ver, os que nos causam uma tremenda indiferença, para não dizer tédio, ou os que nos causam asco e, finalmente, aqueles que a gente pensava que valia a pena, mas quando se deparou frente a frente constatou que a realidade era, de fato, decepcionante. Já tive namorados e ficantes em todos os níveis acima, a mesma sensação despertada pelo zoológico do comportamento humano foi desencadeada por aquele passeio pelo flamejante zoológico paulista.
Na lista dos mais apetecíveis estão sempre os grandes mamíferos: elefante africano, girafa, hipopótamo, onça, orangotango, rinoceronte-branco. Ôpa. Aí já começavam as decepções. De branco mesmo eu só tinha a garantia do nome escrito na placa, pois o bicho, ao ser alocado num terreno coberto de barro, estava da cor da coleção outono de Ronaldo Fraga, só tons terrosos. Mas, vambora, adiante, que o que eu queria mesmo era uma cerveja. Na categoria “até dou uma olhadinha” as aves de bela plumagem. Levam o troféu “prefiro não ver” os répteis, anfíbios, invertebrados e sua longa lista de cágado-cabeçudo, lagartixa-leopardo, sapo cururu e aranha-caranguejeira.
A mais pentelha das sobrinhas, de vozinha fininha e muito mimosinha, no entanto, encasquetou que a gente não podia deixar o recinto sem ver o pinguim de Magalhães. Por mim, eu já tinha parado no tal chifrudo barroso. Mas sabe como é menino, né? E toca a andar, e toca a consultar mapa, e nada do recalcitrante Spheniscus magellanicus. E a paciência já estava no magellanicus. Até que enfim, encontramos, horas depois. Entocado, num corredor periférico, tão mirradinho, tadinho, tão sem charme no seu existir, tão não Discovery Chanel, tão insignificante. Lembrou um cara que eu tive. E que até hoje eu me pergunto, por que foi mesmo que eu me esforcei tanto pra achar?
Flávia de Gusmão, é autora de:
E tome a gente a andar, eu e minha irmã fazendo a escolta, empurradas pelos gritos irritantemente felizes dos pirralhos. Devia estar na TPM, o que automaticamente me transformava também num animal, numa fera hormonal. E tome anta, cachorro-vinagre, camelo, cervo, chimpanzé e um monte de bicho que a gente procurava no mapa apenas para cumprir tabela, já que estava por ali mesmo. E foi aí que a ficha caiu, que a vida imita o zoo, ou será o contrário? Copia tal e qual a escala decrescente daqueles animais que a gente realmente deseja encontrar, daqueles que se estiver no caminho a gente até dá uma olhadinha, aqueles que francamente a gente preferia não ver, os que nos causam uma tremenda indiferença, para não dizer tédio, ou os que nos causam asco e, finalmente, aqueles que a gente pensava que valia a pena, mas quando se deparou frente a frente constatou que a realidade era, de fato, decepcionante. Já tive namorados e ficantes em todos os níveis acima, a mesma sensação despertada pelo zoológico do comportamento humano foi desencadeada por aquele passeio pelo flamejante zoológico paulista.
Na lista dos mais apetecíveis estão sempre os grandes mamíferos: elefante africano, girafa, hipopótamo, onça, orangotango, rinoceronte-branco. Ôpa. Aí já começavam as decepções. De branco mesmo eu só tinha a garantia do nome escrito na placa, pois o bicho, ao ser alocado num terreno coberto de barro, estava da cor da coleção outono de Ronaldo Fraga, só tons terrosos. Mas, vambora, adiante, que o que eu queria mesmo era uma cerveja. Na categoria “até dou uma olhadinha” as aves de bela plumagem. Levam o troféu “prefiro não ver” os répteis, anfíbios, invertebrados e sua longa lista de cágado-cabeçudo, lagartixa-leopardo, sapo cururu e aranha-caranguejeira.
A mais pentelha das sobrinhas, de vozinha fininha e muito mimosinha, no entanto, encasquetou que a gente não podia deixar o recinto sem ver o pinguim de Magalhães. Por mim, eu já tinha parado no tal chifrudo barroso. Mas sabe como é menino, né? E toca a andar, e toca a consultar mapa, e nada do recalcitrante Spheniscus magellanicus. E a paciência já estava no magellanicus. Até que enfim, encontramos, horas depois. Entocado, num corredor periférico, tão mirradinho, tadinho, tão sem charme no seu existir, tão não Discovery Chanel, tão insignificante. Lembrou um cara que eu tive. E que até hoje eu me pergunto, por que foi mesmo que eu me esforcei tanto pra achar?
Flávia de Gusmão, é autora de:
101 crônicas escolhidas
Autor:Flávia de Gusmão
Editora: Flávia de Gusmão
Edição: 1ª
Ano 2012
Autor: Flávia de Gusmão
Baseado vida/obra: Otoniel Abílio da Costa
Editora: Caleidocópio
Assunto: Gastronomia
Edição: 1ª
Ano: 2011
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