Aviso aos brotinhos: o projeto de reforma do Código Civil permite o casamento de meninotas de 14 anos com meninões de 16.
Vem da Bahia, lançada por associações de pais e de professores, uma profecia que é protesto alarmado: -Haverá uma febre de casamentos infanto-juvenis!
Haverá mesmo? Entrevistei sobre o assunto a garota que veio entrevistar-me, pois está na moda colegiais entrevistarem cronistas para trabalhos escolares:
- Se baixar a idade, você casa logo?
Ela não pestanejou para dar o troco:
- Casar para nós não é problema.
Perguntei a você, não perguntei à sua geração.
- E o senhor perguntou foi à minha geração, não a mim. E quem soprou a pergunta ao senhor foi a sua geração. No seu tempo, casar era um problema sério, não era?
- Minha filha, a gente pensava três vezes antes de casar.
- Por isso é que quase nunca dava certo.Pensava três vezes.
-E vocês vão pensar trezentas?
-Nós pensamos em muita coisa além de casamento.Claro que muitas não pensam em nada, pulam e namora, apenas. Mas a turma atualizada procura olhar a vida como um todo. O pessoal do seu tempo só pensava em casar, casar para casar. As mulheres então eram umas possessas.
- Quem te contou isso?
- Não foi vovó, não senhor. A gente, lê reflete e conclui.
- Mas você não respondeu à pergunta. Casa ou não casa aos 14?
- Posso casar aos 14, posso casar aos 21 ou aos 41, posso não casar. Basta saber que posso. Eu é que decido a oportunidade.
- Você sozinha? o namorado não dá palpite?
- Quando eu digo que decido, quero dizer que não é o Código que decide por mim, nem meu namorado. Evidentemente, tenho de estabelecer o diálogo.
-A julgar por você, não haverá epidemia de casamentos de boneca.
- Que é isso, casamento de boneca? O senhor acha que só gente nova é que costuma não ter miolo na cabeça? Tanta gente de cabelos brancos por aí, ou já sem cabelos, fazendo bobagem. Se o Código aumentasse a idade pra 80 anos, ainda haveria casamentos errados.
- Bem, seriam todos errados.
- Outra bobagem. Nem todo velhinho sofre de amolecimento cerebral. Conheço uns bem legais, não digo que me casasse com um deles, mas acho que o casamento com eles deve ter seus encantos. São pessoas cheias de doçura, compreensivas, experientes.
- Tudo que falta ao marido de 16...
- Tudo que está no marido de 16, feito ouro no cascalho ou debaixo da terra. O que precisa é saber encontrar esse ouro, quando ele existe. Se não existe, o senhor compreende, não tem código nem idade que resolva. E em muitos casos só tem mesmo pedra bruta, que fere, que machuca a gente.
- Você sabe coisas!
- Eu não sei nada de especial, sei o que todo mundo pode ver por aí.
- Afinal, qual é sua posição diante dessa novidade do Código?
- Não é novidade nenhuma. Passar o consentimento de 16 para 14 é reconhecer o desenvolvimento biológico. O Código não vai obrigar a gente a casar aos 14 anos, vai? Autoriza apenas. Nós não somos tão doidas como os senhores receiam. E já sabemos alguma coisa a respeito de casamento de nossos pais, e dos pais de nossos colegas. Portanto, não se preocupem. O desquite já existia, a anulação já existia, não vamos ser nós que inventaremos o mau casamento.
- Mas...
- Com licença. Vim aqui para entrevistar o senhor sobre o papel da crônica numa sociedade em transformação, e o senhor é que está me entrevistando sobre mulher em face do Código Civil? Não está direito. Não tenho muito tempo, o senhor vai mas é me responder às minhas perguntinhas...
(Em Caminhos de João Brandão)
Vem da Bahia, lançada por associações de pais e de professores, uma profecia que é protesto alarmado: -Haverá uma febre de casamentos infanto-juvenis!
Haverá mesmo? Entrevistei sobre o assunto a garota que veio entrevistar-me, pois está na moda colegiais entrevistarem cronistas para trabalhos escolares:
- Se baixar a idade, você casa logo?
Ela não pestanejou para dar o troco:
- Casar para nós não é problema.
Perguntei a você, não perguntei à sua geração.
- E o senhor perguntou foi à minha geração, não a mim. E quem soprou a pergunta ao senhor foi a sua geração. No seu tempo, casar era um problema sério, não era?
- Minha filha, a gente pensava três vezes antes de casar.
- Por isso é que quase nunca dava certo.Pensava três vezes.
-E vocês vão pensar trezentas?
-Nós pensamos em muita coisa além de casamento.Claro que muitas não pensam em nada, pulam e namora, apenas. Mas a turma atualizada procura olhar a vida como um todo. O pessoal do seu tempo só pensava em casar, casar para casar. As mulheres então eram umas possessas.
- Quem te contou isso?
- Não foi vovó, não senhor. A gente, lê reflete e conclui.
- Mas você não respondeu à pergunta. Casa ou não casa aos 14?
- Posso casar aos 14, posso casar aos 21 ou aos 41, posso não casar. Basta saber que posso. Eu é que decido a oportunidade.
- Você sozinha? o namorado não dá palpite?
- Quando eu digo que decido, quero dizer que não é o Código que decide por mim, nem meu namorado. Evidentemente, tenho de estabelecer o diálogo.
-A julgar por você, não haverá epidemia de casamentos de boneca.
- Que é isso, casamento de boneca? O senhor acha que só gente nova é que costuma não ter miolo na cabeça? Tanta gente de cabelos brancos por aí, ou já sem cabelos, fazendo bobagem. Se o Código aumentasse a idade pra 80 anos, ainda haveria casamentos errados.
- Bem, seriam todos errados.
- Outra bobagem. Nem todo velhinho sofre de amolecimento cerebral. Conheço uns bem legais, não digo que me casasse com um deles, mas acho que o casamento com eles deve ter seus encantos. São pessoas cheias de doçura, compreensivas, experientes.
- Tudo que falta ao marido de 16...
- Tudo que está no marido de 16, feito ouro no cascalho ou debaixo da terra. O que precisa é saber encontrar esse ouro, quando ele existe. Se não existe, o senhor compreende, não tem código nem idade que resolva. E em muitos casos só tem mesmo pedra bruta, que fere, que machuca a gente.
- Você sabe coisas!
- Eu não sei nada de especial, sei o que todo mundo pode ver por aí.
- Afinal, qual é sua posição diante dessa novidade do Código?
- Não é novidade nenhuma. Passar o consentimento de 16 para 14 é reconhecer o desenvolvimento biológico. O Código não vai obrigar a gente a casar aos 14 anos, vai? Autoriza apenas. Nós não somos tão doidas como os senhores receiam. E já sabemos alguma coisa a respeito de casamento de nossos pais, e dos pais de nossos colegas. Portanto, não se preocupem. O desquite já existia, a anulação já existia, não vamos ser nós que inventaremos o mau casamento.
- Mas...
- Com licença. Vim aqui para entrevistar o senhor sobre o papel da crônica numa sociedade em transformação, e o senhor é que está me entrevistando sobre mulher em face do Código Civil? Não está direito. Não tenho muito tempo, o senhor vai mas é me responder às minhas perguntinhas...
(Em Caminhos de João Brandão)
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