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Balaio de Gatos, Elizabete Bárbara


- Mãe.
- Sim.
- Conta-me uma história antes de dormir.
- Então escuta. Era uma vez uma biblioteca que fazia anos. Estava, portanto, cada vez mais nova.
- Cada vez mais nova, mãe?
- Sim, com as bibliotecas é assim. Quanto mais tempo vivem, mais novas se tornam.
- Porquê?
- Porque quantos mais livros têm, menos sozinhas estão. A solidão envelhece. Quanto mais histórias contam, mais palavras aprendem. Aprender rejuvenesce. Cada sorriso a mais é uma ruga a menos. Cada página folheada é uma lufada de ar fresco. Cada final feliz é a chave do início. Em cada adulto que lê está a criança que foi. Em cada criança que lê está o adulto com memória. É assim a vida, passo a passo, folha a folha, história a história.
- E as bibliotecas, quando fazem anos, não fazem uma festa?
- Claro que sim. Fazem uma festa dentro do coração dos leitores. Os livros juntam-se nas prateleiras e também nas mesas e nas cadeiras e há magia por todo o lado. Saem as fadas dos seus recantos e os segredos dos seus cantos e voam sonhos pelo ar e andam duendes a saltitar pelo chão. E vêm girafas às janelas, cheias de pó de estrelas, bater palmas de emoção. Sabes, meu filho, as bibliotecas são as casas da imaginação."

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