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Mostrando postagens de abril, 2024

Elegia Com Variação Romântica, Nuno Júdice

As mulheres loucas arrumam os quartos, fazem as camas desfeitas, empilham camisas e calças, abotoam os cintos do infinito, prendem os laços da sombra. Com os seus olhos cegos, enfiam agulhas no buraco da vida, cosem as feridas do amor que não tiveram, cantam devagar a canção da idade fria. Dispo essas mulheres no meu poema; espalho as suas roupas pelas cadeiras do quarto; abro a cama onde as deito; rasgo os pontos que acabaram de coser. O seu sexo - seco pelos ventos de uma inquietação nocturna - humedece-me os dedos. Desfolho os dias de março enquanto desfloro os seus lábios. Por vezes, as mulheres loucas abrem a porta da varanda, respiram o perfume das trepadeiras brancas da primavera, desmaiam com o sol. Sobre o autor: Nuno Júdice (29/4/1949-13.3/2024) é um ensaísta, poeta, ficcionista e professor universitário português. Licenciou-se em Filologia Românica pela Universidade de Lisboa e obteve o grau de Doutor pela Universidade Nova. Obras do autor: 50 anos de Poesia - antologia A P

Cravos de Abril, Adalberto Monteiro

Os cravos portugueses Sagraram-se Pelo sangue derramado De negros e alvos. Os cravos, o povo português Os porta à mão como quem empunha um fuzil. E ao cravá-los na lapela, Pulsa-lhes um segundo coração. Os cravos portugueses São perfumados e encarnados De hastes altas, altivos mastros. Na primavera suas pétalas São jorros rubros de vinho. Os cravos dessa terra. O povo os semeia, os cultiva, Os celebra. No 25 de abril, Os portugueses adquirem cravos Como quem compra pão. Carregam cravos e desbravam trevas, As mãos seguram cravos como quem conduz Tochas de fogo e luz. Portugal que criou a ciência dos mares, Vê Lisboa alagada pela esperança, Vê, novamente, nos punhos cerrados do povo A bravura de quem venceu a fúria dos oceanos, E a selvageria dos tiranos. Os opressores argumentam, – Os tempos são outros. E para ter, eternamente, Os trabalhadores como escravos, Alardeiam: os cravos de Abril Murcharam, para sempre, irremediavelmente… Esquecem que eles, São viçosos, teimosos e persistentes

Cantigas de Encurtar Caminho, Olegário Mariano

Bate o luar pelas encostas, Banha vales e grotões. Que noite clara e comprida! Entro no atalho da vida Com um grande saco nas costas, Cheio de recordações. A luz do luar, de mansinho. As sombras da noite espanta: Quem canta encurta caminho, Mata saudades quem canta. Pesa-me êste desalento Que a alma me aperta e espezinha "Caminha!" - murmura o vento, Dizem as nuvens: "Caminha!..." Vem do silêncio das matas Rumor de fonte e cachoeira. Cantam minhas alparcatas Cantando a canção da poeira. Tudo canta! A flor do mato, Uma ave noturna, um grilo Canta o veio do regato, Canta o luar no céu tranquilo. Canta o bacurau na serra, Canta o sapo na lagoa. Sobe do hálito da terra O canto da vida boa. Tanto amor! Tanta promessa Nesta vida em que definho!... E eu vou cantando baixinho... Quem canta chega depressa, Quem canta encurta caminho. Em Toda Uma Vida de Poesia vol.2 Ed.José Olympio 1957, págs.535-536 Nota: o blog manteve a ortografia original Imagem: Pixabay

Prece, Fernando Pessoa

Senhor, que és o céu e a terra, que és a vida e a morte! O sol és tu e a lua és tu e o vento és tu! Tu és os nossos corpos e as nossas almas e o nosso amor és tu também. Onde nada está tu habitas e onde tudo está - (o teu templo) - eis o teu corpo. Dá-me alma para te servir e alma para te amar. Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra, ouvidos para te ouvir no vento e no mar, e mãos para trabalhar em teu nome. Torna-me puro como a água e alto como o céu. Que não haja lama nas estradas dos meus pensamentos nem folhas mortas nas lagoas dos meus propósitos. Faz com que eu saiba amar os outros como irmãos e servir-te como a um pai. Minha vida seja digna da tua presença. Meu corpo seja digno da terra, tua cama. Minha alma possa aparecer diante de ti como um filho que volta ao lar. Torna-me grande como o Sol, para que eu te possa adorar em mim; e torna-me puro como a lua, para que eu te possa rezar em mim; e torna-me claro como o dia para que eu te possa ver sempre em mim e rezar-te

O Pasquim Que Ninguém Viu, Guttemberg Guarabyra

O licor polonês que encontrei no armário de bebidas do cartunista Ziraldo era de cerejas. Não sei de que espécie, pois há vários tipos de cerejeiras. Um deles, o Primus avium, fornece uma bela madeira usada na fabricação de instrumentos musicais, além de frutas muito doces. Independentemente de saber que tipo de cerejeira existiria na Polônia, estava mesmo curioso era para conhecer o gosto da bebida. Pedi um trago. O licor era saborosíssimo. Como havia dezenas de garrafas, perguntei se não me ofertaria uma de presente. Ziraldo negou-me a dádiva explicando que comprara aquilo tudo para ser apreciado em casa com os amigos. Que eu poderia consumir o quanto desejasse, desde que fosse com ele e na casa dele. Mariozinho Rocha, ao meu lado, disse que topava a parada. Ziraldo foi buscar os copos. Os que ali estavam haviam participado comigo, momentos antes, de uma reunião, e vieram se juntar a nós para apreciar o licor. Entre eles, Sérgio Cabral pai, Millôr Fernandes, Jaguar e demais

O Livro Mais Velho Da Minha Estante

     Postei aqui sobre a devolução de um livro 105 anos depois da data agendada.  O livro estava em muito bom estado e isso me chamou a atenção.   Tenho toda a obra de Olegário Mariano, que comprei em 3 sebos e são os livros mais velhinhos que tenho em minha estante. Dois deles foram, em algum momento,  reencadernados com capa dura o que demonstra  que alguém deu importância ao objeto.       Outro chegou literalmente caindo aos pedaçõs. Para conseguir ler improvisei uma capa, que me permitisse manuseá-lo sem acabar de rasgar.    O interior do livro relativamente bem conservado. Quem leu não fez nenhum risco, orelha de burro, nada! O vol. 2 da coleção *  veio com capa dura. Para quem tem 67 anos, em ótimas condições. De saída chama a atenção a palavra "tôda" ainda escrito com acento.  Era assim  naquela época!! * Olegário Mariano escreveu vários livros e em 1957 a Ed. José Olympio reunião em 2 volumes.  São esses idosos que estão na minha estante.      Amiga do grupo de leitur

A Mulher Que Caiu do Céu, Luís Fernando Veríssimo

  1. A mesma ladainha       Começo do dia no apartamento da família Vieira. Dona Margarida, a mãe, acordou mais cedo do que os outros e tenta botar as coisas em movimento, como faz todos os dias. Chama o marido: — Zé Roberto, olha a hora. Chama a filha: — Michelle, tá na hora, minha filha. Chama o filho: — Duda, acorda. Ninguém se mexe. Margarida tem uns 38 anos, Zé Roberto, quarenta e poucos. Michelle, 16, Duda, 11. O apartamento é pequeno, de classe média, mas tem três quartos. Da cozinha, onde começou a preparar o café, Margarida grita: — Zé Roberto, não é hoje que você tem uma reunião na firma? Olha a hora. Margarida entra no quarto do Duda e sacode seu pé. — Duda, tá na hora. Vamos, meu filho. Duda só rosna. Margarida entra no quarto da Michelle e também a sacode. — Michelle, levanta. Aproveita que o banheiro está livre. Michelle só rosna. Margarida volta para o quarto do casal: — Zé Roberto, sua reunião não é importante? Zé Roberto produz uma frase ininteligível. Margarida: — Pel

Com 105 Anos de Atraso Livro É Devolvido à Biblioteca

  Após mais de 100 anos de atraso, um romance clássico foi devolvido a uma biblioteca do estado do Colorado. Se o sistema bibliotecário ainda impusesse multas por atraso,  a taxa pela devolução da obra chegaria a milhares de dólares .  Segundo relatado pelo NY Post, o  romance histórico 'Ivanhoe' , do escritor escocês  Walter Scott , foi deixado na  Biblioteca Poudre  105 anos depois do dia marcado para ser devolvido; originalmente a devolução ocorreria em 13 de fevereiro de 1919. A obra foi deixada no local somente no início deste mês, por uma mulher que não se identificou. O livro foi encontrado por seu irmão enquanto ele vasculhava os pertences de sua mãe no Kansas, informou a biblioteca em um comunicado à imprensa.  Quando o livro foi pego na biblioteca, os Estados Unidos era presidido por  Woodrow Wilson . Nessa época, a multa por livro vencido  era de dois centavos de dólar por dia. Caso fosse necessário enviar um mensageiro para recolher o livro, o infrator ainda ficaria

Brasil na Feira do Livro Infantil de Bolonha - ed. 2024

A feira de Bolonha é o mais importante evento de literatura voltada para  crianças e jovens e o Brasil teve sua melhor participação:  levou 23 editoras e recebeu premiações. Renato Moriconi ( Taboão da Serra -SP) e  Henrique Coser Moreira ( Curitiba -PR)   foram nossos destaques.  Renato Moriconi fez o melhor livro infantil para bebês. Dia de Lua ( Ed. Jujuba). O júri do prêmio destacou o cuidado com cada detalhe gráfico, como a capa sem título, os cantos arredondados e a paleta de três cores (azul, branco e preto). Entre os pontos ressaltados, também estavam a criatividade e a mistura de elementos. Além disso, o júri elogiou a proposta de narrar o dia da lua, a qual exerce funções diferentes para além de iluminar o céu, transformando-se em rede, guarda-chuva, chifre de rinoceronte e outros. “A pureza do design gráfico do livro cativa os leitores nesta jornada diurna/lunar magistralmente executada”. ( Estadão)      Outro brasileiro, um jovem curitibano, foi premiado como ilustrador.