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Depoimento, Mia Couto



Eis o meu contento:
nunca pisei chão que fosse meu.


E o quanto sonhei
foi um desfolhar de estação,
uma pluma sem destino.


Eu vi o vazar dos rios
e vivi sem saber onde eu estava vivo.


E amei
como se nunca antes
ninguém tivesse amado.


E sonhei
como se fosse o primeiro último homem.


Em: Mia Couto, poemas escolhidos, pag. 69

Desenho de: Pedro Manaças



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