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Mostrando postagens de abril, 2015

Penélope, Dalton Trevisan

     Naquela rua mora um casal de velhos. A mulher espera o marido na varanda, tricoteia em sua cadeira de balanço. Quando ele chega ao portão, ela está de pé, agulhas cruzadas na cestinha. Ele atravessa o pequeno jardim e, no limiar da porta, beija-a de olho fechado.            Sempre juntos, a lidar no quintal, ele entre as couves, ela no canteiro de malvas. Pela janela da cozinha, os vizinhos podem ver que o marido enxuga a louça. No sábado, saem a passeio, ela, gorda, de olhos azuis e ele, magro, de preto. No verão, a mulher usa um vestido branco, fora de moda; ele ainda de preto. Mistério a sua vida; sabe-se vagamente, anos atrás, um desastre, os filhos mortos. Desertando casa, túmulo, bicho, os velhos mudam-se para Curitiba      Só os dois, sem cachorro, gato, passarinhos. Por vezes, na ausência do marido, ela traz um osso ao cão vagabundo que cheira o por

Rimas de Luar, Austro Costa

Pela noite calma anda um misticismo que é de lua cheia. Tua imagem calma, nesse misticismo lívida vagueia... Tão alva e magrinha, és um crisântemo que se despetala; frágil almazinha que é de crisântemo que o Luar embala! Vens sorrindo, leve, num sorrir divino que é fascinação. Vens sorrindo, leve vens cantando o hino da minha ilusão. Passas... És saudade! Lembras a distância que entre nós está. Páras. E a Saudade mais aumenta a ânsia que arde aqui e lá. Abro-te minh’alma. Entras,e, em lirismo, teu sorriso Salma*... Luz a Lua-Cheia... E. num misticismo, pela noite calma, tua imagem calma dentro de minh’alma, toda luar passeia... Austro Costa Mulheres e Rosas 2ª edição revista. Ed. Cepe 2012 Nota: o blog manteve a grafia original *Salma: o poeta criou um neologismo com o substantivo salmo.

Nana Pauvolih - A Rainha da Amazon Brasil, Suzana Valença

O sobrenome dela é P-a-u-v-o-l-i-h. Mas, entre os fãs, ela é conhecida só como Nana mesmo. Se você ainda não ouviu falar nela, não tem problema. Nana Pauvolih é, provavelmente, a escritora bem sucedida mais desconhecida do Brasil . Ela não está em nenhum das listas de livros mais vendidos publicadas nas revistas semanais. Mas não se engane, o território dela é outro. Nana domina as vendas de ebooks no Brasil. Na Amazon nacional ela está no topo do ranking de best-sellers e sua média de avaliação “varia” entre 5 e 5 estrelas. No universo online, Nana Pauvolih é unanimidade . Mas porque Nana Pauvolih é tão conhecida apenas no mundo literário digital? É que ela escreve livros eróticos. Quem tem vergonha de comprar livros eróticos? “Livros online são mais baratos, práticos, não ocupam espaço. E para quem quer ler um erótico sem mostrar à família, também fica mais fácil . São grandes as vantagens”, conta a autora. Como muitos leitores têm vergonha d

Dragão, Livro e Rosas.

                     Aprendi com minha irmã que aprendeu na aula de espanhol  e trago para cá, dizendo que gostaria de conhecer a Catalunha nessa época do ano.                                        Era uma vez um dragão que aterrorizava a todos numa aldeia da Espanha há muitos e muitos anos passados. Para acalmar a fúria do animal, a ele era oferecida uma donzela por dia.                 Num determinado momento já não havia mais nenhuma donzela a não ser a filha do rei. E ela foi oferecida ao dragão (ooooohhh). Acontece que um jovem cavaleiro era apaixonado por ela e resolveu lutar contra o dragão e ganhou a luta.                  Era inverno e toda a neve do local da luta ficou tingido com o vermelho do sangue do dragão.  Mas quando a filha do rei - que como tem de ser em toda lenda, devia ser linda - olhou para ao redor, onde antes havia sangue, cresceram rosas e mais rosas.                                 Este dia, 23 de abril passou a ser o dia das rosas.  Muitos an

Provo, Sinto Em Silêncio, Joaquim Cardozo

Provo, sinto em silêncio O gosto de tua presença, O gosto da presença feliz o teu corpo inocente e querido. Vejo que as ruas mãos formosas e mansas Movem-se para mim num desejo incerto de carícia, num gesto vago e litúrgico, E ouço a tua voz chegando como uma reza, Imersa em sombra, envolta em fumo, fragrante e leve. Mulher! em meio deste perfume, Incenso que vem de ti e das flores que trazes no seio, Mudo como um Deus quero ser adorado.

Papagaio Congelado, Ricardo Azevedo

Um dia, um sujeito ganhou de presente um papagaio. O bicho era uma praga. Não demorou muito, logo se espalhou pela casa. Atendia telefone. Gritava e falava sozinho nas horas mais inesperadas. Dava palpite nas conversas dos outros. Discutia futebol. Fumava charuto. Pedia café, tomava, cuspia, arregalava os olhos, esparramava semente de girassol e cocô por todo lado, gargalhava e ainda gritava para o dono de casa: "Ô seu doutor, vê se não torra faz favor!" Uma noite, a família recebeu uma visita para jantar. O papagaio não gostou da cara do visitante e berrou: "Vai embora, ratazana!" e começou a falar cada palavrão cabeludo que dava medo. Depois que a visita foi embora, o dono da casa foi até o poleiro. Estava furioso: — Seu mal-educado, sem-vergonha de uma figa! Estou cheio! Agora você vai ver o que é bom pra tosse. Agarrou o papagaio pelo cangote e atirou dentro da geladeira: — Vai passar a noite aí de castigo! Depois, fech

Os Romanos, Rubem Braga

Foi no Leblon, no domingo de sol, e não era escola de samba e nem rancho direito, era apenas uma tentativa de rancho, sem mulheres, sem música própria. Eram quase todos muito fortes e vestidos da maneira mais imaginosa, com saiotes e escudos e capacetes com muitos dourados e prateados, e de espada na mão. Cantavam o samba estranho Maior é Deus no céu e no estandarte estava escrito assim: Henredo o Império Romano."

Livros no varal - o que o grupo vai ler.

  Contos do Nascer da Terra, Mia Couto De Regina Vai para:Amanda (PB) Malu (RJ)   A Abadia de Northanger, Jane Austen De: Tânia  Vai para: A Mulheres do Meu Pai, José Eduardo Agualusa De: Regina Vai para: Amanda (PB), Malu (RJ)   A Cidade do Sol, Khaled Hosseini De:Aline Vai para: Passaporte Para a China, Lygia Fagundes Telles De: Tânia Vai para: Regina O Segredo do Meu Marido, Liane Moriarty De: Regina Está com: Tânia Vai para:  O Silêncio das Montanhas, Khaled Hosseini De: Aline Vai para: Sal, Letícia Wierzchowski De: Cris Vai para:Regina   Umbilina e Sua Grande Rival, Cícero Belmar De: Regina Vai para:Malu (RJ) Hanna e Suas Filhas, Marianne Fredricksson De: Janete Está com: Cris Vai para:  Inferno, Dan Brown De: Cris Vai para:

Tarde de Domingo, Ana Paula Corradini

      Seis pratos sobre a pia. Cinco vazios, um ainda com lasanha à bolonhesa. Um filho que não gosta de lasanha à bolonhesa. Zero filhos para tirar o resto da mesa. Uma mãe de mãos ásperas, um pai de dedos ágeis. Um controle remoto. Zero sobremesas. Quatro reclamações. Um filho que não gosta de sobremesa. Dez dedos indicadores, um controle remoto. Cinquenta programas simultâneos na TV a cabo. Cinco opiniões, dois safanões, um grito vindo da cozinha. Quatro silêncios e uma bateção de porta. Um filme, quatro sorrisos. Um choro abafado no banheiro. Uma palavra doce de mãe. Seis pratos lavados, doze talheres guardados, uma caçarola areada. Duas mãos em repouso. Cinco lugares ocupados. Uma poltrona vaga. Uma birrinha no canto da sala. Um colo. Duas lágrimas já enxutas. Um ressonar, dois ressonares, três... Cinco roncos. Dois olhos bem abertos. Um bico desse tamanho.

As Mulheres do Meu Pai - Última página

    ... " Fui à praia depois do jantar. Não havia ninguém. Estrelas brilhavam na límpida imensidão do firmamento. Consegui distinguir o Cruzeiro do Sul, e Vênus, a quem os antigos chamavam de Lúcifer, a que carrega a luz. Despi-me e entrei n mar - a água era lisa e tépida - com a sensação de que mergulhava na própria noite. No século XIII escrevia-se noyte. Digamos então que eu me senti mergulhar na noyte, sugado pelo seu vórtice escuro, e que fechei os olhos e quando os reabri vi as estrelas  a girar ao meu redor.  Movia os braços e cada movimento parecia gerar um tumulto de estrelas. Conheço pessoas que passaram por esta experiência e entraram em pânico. Outras em êxtase. Muitas falam em embriaguez, a maioria em sonho.  O fenómeno é provocado por um pequeno organismo unicelular, a noctiluca, capaz de emitir luminescência, e chama-se  ardência marítima ou, no sul de Portugal, agualusa . Fiquei muito tempo no mar, divertindo-me, como um pequeno Deus inclemente, a criar e des

O Moleque Ricardo, Carlos Benites.

     O menino Ricardo estava feliz. Enfim viveria definitivamente com o pai. Com 14 anos, quase não tinha lembranças físicas de seu pai, o grande escritor Graciliano Ramos. Custou a entender a razão de que só ele ficara em Alagoas, criado pelo avô Américo e sua tia, desde os sete anos de idade, enquanto suas irmãs tinham viajado com a mãe para se encontrarem com o pai. Trazia na memória as férias que passara aos 10 anos no Rio de Janeiro e levou orgulhoso seu boletim para mostrar a seu pai, mas este disse apenas um lacônico “Está bom”. Agora, aos 14 anos, seria diferente. Estaria com as irmãs Clarita e Luiza e a mãe Heloisa. Já não teria que se agarrar às cartas para ter contato com pai e mãe.  Mesmo com a grande distância, nutria um carinho e admiração pelo pai. Até quando os familiares tentavam poupá-lo das notícias cruéis do tempo da prisão de seu pai, ele acompanhava quieto e preocupado cada momento. Desde antes da viagem de sua mãe, ficava sempre com os ouvidos prontos para ou