Amar um clube é muito mais que amar uma mulher. E eu sigo à risca o
conselho do mestre. Ao longo da vida, já me casei, troquei de namoradas, sei
lá, dezenas de vezes. Outras tantas fui trocado por elas, mas a recíproca não
está em jogo, agora. Jamais trocaria o Botafogo, nem por outro clube, nem por
nada, neste mundo.
Guardo até hoje, íntegro, o sentimento do primeiro encontro. Foi na
cozinha da casa da minha mãe, enquanto a própria passava roupa, na noite de 21
de junho de 1989. Tinha eu apenas dez anos, e não estava muito interessado com
aquele time, do goleiro Ricardo Cruz ao atacante Maurício, todos eles jogadores
medianos, mas todos traziam no peito uma estrela de cinco pontas, radiosa como
a luz daquela noite iluminada.
O jogo era, pra se esperar, Botafogo e Flamengo. Decisão do carioca
daquele ano.
Naquela época, até então, o Botafogo ainda não tinha me enfeitiçado,
apesar de eu já ter desfilado anteriormente com o manto alvinegro por “ordem”
do meu pai. Eu tinha tudo pra não ser botafoguense: meu pai tinha recém
separado da minha mãe, o Botafogo vinha de mais de duas décadas em sua história
sem a conquista de um único título, e os times do momento Corinthians, São
Paulo, e o próprio Flamengo, encantavam o país.
A partida teve inicio e eu da cozinha sentia que aquela noite entraria
definitivamente em minha história. O Maracanã estava lotado com mais da metade
do público presente trajando rubronegro. Comecei a ver o jogo como mero
espectador, mas o destino resolveu me dar a cartada final em meu coração, pois
aos 21 minutos do segundo tempo me veio a revelação com o gol de Maurício. Meu
coração transbordou, meus olhos encheram-se de lágrimas, e eu, enfim, me
apaixonei.
Hoje, quase vinte anos depois, eu me pergunto, por mera curiosidade, por
que será que não escolhi torcer pro Flamengo? Afinal o Flamengo era o time mais
querido do Brasil. Dava ibope torcer pro Flamengo. Tinha uma constelação de
craques, de Zico a Junior o time era um assombro. Era certeza de alegria pela
frente. Eu, no entanto, resolvi trocar o certo pelo duvidoso. Afinidades
eletivas, meus amigos. Premonição, talvez. Enfim, coisas do coração, pois no
final do jogo era o Botafogo que dava a volta olímpica no Maraca, campeão
invicto.
Ali nascia minha grande paixão, apesar de que o Botafogo nem sequer
sabia da minha reles existência. Não sabia, nem precisava saber. O futebol é
assim: desperta na pessoa um sentimento virtuoso que transcende a amizade, que
vai além do amor e culmina no santo desvario da paixão. Tem de tudo um pouco,
porém, é mais que tudo. Torcer por uma camisa é plena entrega. É mais que ser
mãe, porque não desdobra fibra por fibra o coração. Destroça-o de uma vez no
desespero de uma derrota. Em compensação, remoça-o no delírio de uma vitória.
O Botafogo tem tudo a ver comigo: por fora, é claro-escuro, por dentro,
é resplendor; o Botafogo é supersticioso, eu também sou. O Botafogo é bem mais
que um clube – é uma predestinação celestial. Seu símbolo é uma entidade
divina. Feliz da criatura que tem por guia e emblema uma estrela. Por isso é
que o Botafogo está sempre no caminho certo. O caminho da luz. Feliz do clube
que tem por escudo uma invenção de Deus.
Estrela solitária.
O torcedor do Botafogo tem um coração repleto de memoráveis cintilações:
convivem, na mesma estrela, craques que não só nos orgulharam, botafoguenses,
mas toda a nação brasileira, de Heleno de Freitas à Túlio Maravilha, passando
por outros tantos, como Garrincha, Didi, Quarentinha, Maurício, etc, etc…
Da cozinha de casa naquela noite de 1989 até os dias de hoje foram
muitas as lágrimas, tanto de desespero quanto de fulgor. O Botafogo tem o dom
de me levar do inferno ao paraíso, e vice-versa. Ele é como eu: é preto no
branco, é 8 ou 80. Somos assim, ou é agonia ou é êxtase.
O Botafogo sou eu mesmo, sim senhor!
Nota 10
ResponderExcluirAlguém conhece o "dono" deste desenho da estrela com a camisa do Botafogo? Por favor, quem souber, envie um e-mail pra mim, por favor: snopires@gmail.com! Obrigado!
ResponderExcluirCaro jovem, a imagem fofa da estrela com a camisa do Botafogo é do chargista Brum. Você pode segui-lo no Instagram:#https://www.instagram.com/rabiscosdobrum/. Agradeço por seu comentário que me levou a novamente procurar a autoria, porque na época da postagem não consegui. Bom dia.
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