Toquei a campainha. Meu neto Pedro abriu a porta e já foi
anunciando: “Papai tá todo cagado.” Pensei logo numa tragédia alimentar. “Ele
comeu o quê?! “foi Mateus!” De fato. João, meu filho, pai dos dois, Pedro e
Mateus, tava que era cocô só, da cabeça aos pés. “Não disse?”, tripudiou Pedro
diante da cena.
E Mateus, o cagão, no trocador de fraldas, rindo,
cara-de-não-tô-nem- aí.
Pedro tem quase
cinco anos; Mateus, dois meses. João tinha acabado de limpar a bunda dele,
passando creme, talquinho, essas coisas, pra botar a fralda nova. Quando suspendeu
pelos pés, bunda pra cima – ou seja, posição de tiro – o artilheiro disparou.
Duas rajadas. As duas na mosca.
João é um pai
arretado. Minha nora Juliana não deve ter queixa=as dele nessa área, acho eu. Noutras,
não sei.
No dia em que Mateus nasceu, João entrou de férias. E de
resguardo. Cada mamada, é ele quem pega Mateus no berço e leva pro peito de
Juliana. Depois de mamar, ombro do pai pra arrotar. E assim também foi com o
Pedro.
Recém nascido, João
tinha cólica direto. Eu, marinheiro de primeira viagem, o que doía nele, doía em
mim. Pra não dar remédio, esfregava uma mão na outra pra esquentar e espalmava sobre a barriga dele. Se não passasse – e quase nunca passava – aquecia
uma fralda com ferro elétrico e botava sobre a barriga. Santo remédio.Quase
sempre de madrugada. E, horas depois, ia trabalhar morrendo de sono. Mas com
uma história comovente – achava eu – pra contar ao pessoal da agência e até
cliente.
À noite, lia
histórias de livros infantis pra ele e Joana, cada um de um lado, cabeças sobre
meus braços. Claro que os Irmãos Grimm também entravam no repertório (Branca de
Neve, Rapunzel, A Bela Adormecida... ) mas as preferências deles ( e minhas)
eram histórias escritas por escritores do tope de Victor Hugo, Voltaire, Singer,
Tolstoi, Hemingway... de uma coleção maravilhosa, Abre-te Sésamo, da Record. (Já
encomendei duas coleções, agora acrescidas por obras de outros autores,
inclusive brasileiros, como Graciliano, Fernando Sabino e Jorge Amado para que
João as conte a Pedro e Mateus e Joana para Maria Júlia e Francisco.)
Cinema, teatro e
circo eram comigo mesmo. Levava os dois, além dos sobrinhos e filhos de amigos.
Para os piqueniques na deserta Praia do Paiva, também. E os preparativos começavam
na véspera: sucos, frutas, sanduiches, brinquedos, boias e, até, sacos para
lixo. Com algum sacrifício, pois o dinheiro era curto, fins de semana e semanas
santas em Gravatá e Caruaru ( o Hotel do Sol era uma maravilha) e nas viagens,
mesmo a trabalho, os dois iam comigo pro Rio, São Paulo e Brasília.
Eu achava que
tinha sido um pai até mais ou menos. Mas fiquei devendo. E muito. Não dá pra
comparar com João. Nem como pai nem como marido (aqui to falando de
companheirismo e divisão das chamadas tarefas domésticas).
“Agora ele não me
pega mais desprevenido”, disse João outro dia com uma fralda na mão,
demonstrando sua estratégia de defesa para um eventual novo ataque de Mateus.
“Quero ver só” – duvidou Pedro, com ares de quem já viu esse
filme.
(publicado no JC do dia 02.11.2013
Tem livro do Joca, esse daí da imagem acima, já à venda nas livrarias.
Tem livro do Joca, esse daí da imagem acima, já à venda nas livrarias.
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