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Sozinho no Bar, crônica de Aluizio Falcão

     Nove da noite no bar Bohemia. Movimentadíssimo na madrugada este bar, em horas cristãs, tinha um silêncio de mosteiro. Na mesa  ao lado, um jovem casal is tocando sua conversinha em voz baixa, mas eu podia ouvir claramente. Ele dizia que era da Mooca e nem precisava dizer, o sotaque revelava. A moça era do interior, informação também desnecessária, dado o erre esticado em certas sílabas, tão presente na fala caipira de São Paulo. Eu acompanhava a conversa discretamente, sem olhar, como quem ouve um programa de rádio. O rapaz se esforçava para impressionar, dizia que gostava de ler, desfiava títulos best-sellers. A namorada, modesta, nem se lembrava do último livro que lera, comentava a novela das oito. Depois, graças a Deus, abandonaram os temas estéticos. Enveredaram pelos floridos caminhos da intimidade. Ela disse "eu te gosto"com voz trêmula, e senti uma vaga inveja por serem tão jovens e tão felizes. Onde estarão hoje, passados tantos anos? Fico a imaginar quntas pessoas já ocuparm aquelas mesas e se disseram juras e frases perdidas para sempre. Algumas até deveriam ter sido escritas, de tão bonitas que eram. Assim são os bares: museus de conversas que se foram, beijos que os fantasmas  beberam pelo caminho, antigas ternursa desfeitas pelo tempo, esse filho da puta.

     Naquela noite eu esperava retardatários. A presença do jovem casal  no bar tornou menso desconfortável a falta de companhia. Ficar sozinho em botequim é a pior forma de solidão. Lembro de um episódio que se atribui a Tom Jobim, não sei se real, mas típico senso de humor do grande músico.

    Contaram que Jobim chegou ao bar favorito e ficou esperando a turma: Vinícius, Chico Buarque&Cia. Passavam-se horas, não aparecia inguém. Toda vez que a porta do bar se abria, o maestro olhava curioso, e nada. Somente chegavam estranhos, como estranha era toda a freguesia em volta, incluindo moças desacomapnhadas que o solitário compositor observava, já depois da terceira dose, com interesse cada vez maior. As moças, porém, continuavam o papo, indiferentes aos seus olhares.

      Para tornar ainda mais triste a solidão de Tom Jobim, alguns casais nas mesas próximas caprichavam em cenas românticas. Tudo conspirava para que ele acelerasse o consumo de uísque. Sem ter com quem conversar nos bares as pessoas tendem a beber mais. O maestro não fugia e essa regra boêmia. Num dado instante, de copo vazio, espiava com inveja um casal se beijando, quando o garçom aproximou-se: "O senhor quer alguma coisa?" E Jobim, imperativo: "GArçom, beije-me". 

Em:Cronistas de Pernambuco. Org. antonio Campos e Luiz CArlos Monteiro. CarpeDien 2010, págs 36-37.

 

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