Pular para o conteúdo principal

Conheça A Verdadeira História do 8 de Março.


Março das Mulheres | Conheça a verdadeira
história do 8 de março

Pesquisadora afirma que a origem da data foi propositalmente dissociada da luta das trabalhadoras da União Soviética

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

Todos os anos, divulga-se a história de que o Dia Internacional da Mulher surgiu em homenagem a 129 operárias estadunidenses de uma fábrica têxtil que morreram carbonizadas, vítimas de um incêndio intencional no dia 8 de março de 1957, em Nova York. Segundo a versão que circula no senso comum, o crime teria ocorrido em retaliação a uma série de greves e levantes das trabalhadoras. 

Embora essa seja a narrativa mais conhecida, quando se fala sobre a origem da data comemorativa, ela não é verdadeira.

O primeiro registro remete a 1910. Durante a II Conferência Internacional das Mulheres em Copenhague, na Dinamarca, Clara Zetkin, feminista marxista alemã, propôs que as trabalhadoras de todos os países organizassem um dia especial das mulheres, cujo primeiro objetivo seria promover o direito ao voto feminino. A reivindicação também inflamava feministas de outros países, como Estados Unidos e Reino Unido.

No ano seguinte, em 25 de março, ocorreu um incêndio na fábrica Triangle Shirtwaist, em Nova York, que matou 146 trabalhadores -- incluindo 125 mulheres, em sua maioria mulheres imigrantes judias e italianas, entre 13 e 23 anos. A tragédia fez com que a luta das mulheres operárias estadunidenses, coordenada pelo histórico sindicato International Ladies' Garment Workers' Union (em português, União Internacional de Mulheres da Indústria Têxtil), crescesse ainda mais, em defesa de condições dignas de trabalho.

As russas soviéticas também tiveram um papel central no estabelecimento do 8 de março como data comemorativa e de lutas. Por “Pão e paz”, no dia 8 de março de 1917, no calendário ocidental, e 23 de fevereiro no calendário russo, mulheres tecelãs e mulheres familiares de soldados do exército tomaram as ruas de Petrogrado (hoje São Petersburgo). De fábrica em fábrica, elas convocaram o operariado russo contra a monarquia e pelo fim da participação da Rússia na I Guerra Mundial. 

:: A Revolução das Trabalhadoras :: 

A revolta se estendeu por vários dias, assumindo gradativamente um caráter de greve geral e de luta política. Ao final, eliminou-se a autocracia russa e possibilitou-se a chegada dos bolcheviques ao poder.

A atuação de mulheres russas revolucionárias como Aleksandra Kollontai, Nadiéjda Krúpskaia, Inessa Armand, Anna Kalmánovitch, Maria Pokróvskaia, Olga Chapír e Elena Kuvchínskaia, é considerada imprescindível para o início da revolução.

“A história real do 8 de março é totalmente marcada pela história da luta socialista das mulheres, que não desvincula a batalha pelos direitos mais elementares -- que, naquele momento, era o voto feminino -- da batalha contra o patriarcado e o sistema capitalista”, ressalta a historiadora Diana Assunção, integrante do coletivo feminista Pão e Rosas.

A pesquisadora explica que houve uma articulação histórica para esvaziar o conteúdo político do 8 de março, transformá-lo em “uma data simbólica inofensiva” e em um nicho de mercado, apagando sua origem operária. 

“No dia da mulher, compram-se flores e presentes para as mulheres. Tentam esconder o conteúdo subversivo do significado desse dia, que é questionar o patriarcado. Tentam esconder que a luta das mulheres sempre esteve vinculada à luta socialista, perigosa para o status quo”, acrescenta Assunção. 

Em 1921, na Conferência Internacional das Mulheres Comunistas, o dia 8 de março foi aceito como dia oficial de lutas, em referência aos acontecimentos de 1917. A data foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975.

Retornar às origens

A cada 8 de março, as mulheres trazem à tona questionamentos sobre a hipocrisia em torno das homenagens que recebem apenas nessa data. Em todos os dias do ano, o gênero feminino é o principal alvo da violência e da desigualdade. 

Em resposta, trabalhadoras em todo o mundo se organizam cada vez mais pela defesa de seus direitos. Em 2017 e 2018, elas organizaram uma greve internacional com adesão de 40 países, com o lema “Se nossas vidas não importam, que produzam sem nós”.  Assunção comemora o “resgate de um método de luta da classe operária de enfrentamento aos patrões e aos capitalistas”. 

"O que estamos vendo é justamente que a revolta e a luta de classes têm rosto de mulher a nível internacional, com a luta a que estamos assistindo nos últimos anos, com essa verdadeira primavera feminista no mundo inteiro, com enormes marchas. Mas, agora, com uma cara cada vez mais operária", ressalta. "As mulheres são metade da classe operária, e as mulheres negras estão mostrando que são linha de frente em vários processos de luta". 

A historiadora avalia que é importante resgatar a verdadeira origem do Dia Internacional da Mulher, pois, segundo ela, foram as proletárias que avançaram efetivamente em medidas concretas para atacar os pilares que sustentam a opressão às mulheres. “Mais do que nunca, precisamos da organização dos trabalhadores com as mulheres à frente, mostrando que são vanguarda, inclusive da classe operária. Enfim, sacudindo os movimentos, os sindicatos, com toda força expressada internacionalmente”, enfatiza. 

Assunção possui grandes expectativas para o 8 de março de 2019, comemorado com mobilizações em dezenas de países e em todos os estados do Brasil. “O oito de março que estamos vivendo agora precisa ser internacional, como parte da luta por uma paralisação internacional de mulheres, que enfrente o Bolsonaro [PSL], que enfrente todos os presidentes da extrema direita. Essa é a perspectiva que deveria ser levada à diante. Por Marielle e por todas as mulheres assassinadas. É preciso entender que o capitalismo é uma suja prisão, e que precisamos lutar por uma nova sociedade”, defende a pesquisadora, ressaltando, mais uma vez, o legado das mulheres revolucionárias. 



Essa matéria faz parte do especial Março das Mulheres, produzido pelo Brasil de Fato.
Edição: Mauro Ramos
Imagem: reprodução constante da matéria que trouxe na íntegra do site Brasil de Fato.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Beleza Total, Carlos Drummond de Andrade.

A beleza de Gertrudes fascinava todo mundo e a própria Gertrudes. Os espelhos pasmavam diante de seu rosto, recusando-se a refletir as pessoas da casa e muito menos as visitas. Não ousavam abranger o corpo inteiro de Gertrudes. Era impossível, de tão belo, e o espelho do banheiro, que se atreveu a isto, partiu-se em mil estilhaços. A moça já não podia sair à rua, pois os veículos paravam à revelia dos condutores, e estes, por sua vez, perdiam toda a capacidade de ação. Houve um engarrafamento monstro, que durou uma semana, embora Gertrudes houvesse voltado logo para casa. O Senado aprovou lei de emergência, proibindo Gertrudes de chegar à janela. A moça vivia confinada num salão em que só penetrava sua mãe, pois o mordomo se suicidara com uma foto de Gertrudes sobre o peito. Gertrudes não podia fazer nada. Nascera assim, este era o seu destino fatal: a extrema beleza. E era feliz, sabendo-se incomparável. Por falta de ar puro, acabou sem condições de vida, e um di

Mãe É Quem Fica, Bruna Estrela

           Mãe é quem fica. Depois que todos vão. Depois que a luz apaga. Depois que todos dormem. Mãe fica.      Às vezes não fica em presença física. Mas mãe sempre fica. Uma vez que você tenha um filho, nunca mais seu coração estará inteiramente onde você estiver. Uma parte sempre fica.      Fica neles. Se eles comeram. Se dormiram na hora certa. Se brincaram como deveriam. Se a professora da escola é gentil. Se o amiguinho parou de bater. Se o pai lembrou de dar o remédio.      Mãe fica. Fica entalada no escorregador do espaço kids, pra brincar com a cria. Fica espremida no canto da cama de madrugada pra se certificar que a tosse melhorou. Fica com o resto da comida do filho, pra não perder mais tempo cozinhando.      É quando a gente fica que nasce a mãe. Na presença inteira. No olhar atento. Nos braços que embalam. No colo que acolhe.      Mãe é quem fica. Quando o chão some sob os pés. Quando todo mundo vai embora.      Quando as certezas se desfazem. Mãe

Os Dentes do Jacaré, Sérgio Capparelli. (poema infantil)

De manhã até a noite, jacaré escova os dentes, escova com muito zelo os do meio e os da frente. – E os dentes de trás, jacaré? De manhã escova os da frente e de tarde os dentes do meio, quando vai escovar os de trás, quase morre de receio. – E os dentes de trás, jacaré? Desejava visitar seu compadre crocodilo mas morria de preguiça: Que bocejos! Que cochilos! – Jacaré, e os dentes de trás? Foi a pergunta que ouviu num sonho que então sonhou, caiu da cama assustado e escovou, escovou, escovou. Sérgio Capparelli  CAPPARELLI, S. Boi da Cara Preta. LP&M, 1983. Leia também: Velho Poema Infantil , de Máximo de Moura Santos.