Aliás, imóvel é o termo perfeito para definir aquela casa. Uma casa onde já não se ouvem músicas. Onde nenhuma risada interrompe o incômodo silêncio da solidão e onde nada, ou quase nada mais acontece.
Uma casa onde um centenário relógio, na parede da sala, não marca mais as horas: deixou de funcionar faz exatos 23 anos e dois meses - mesmo tempo em que a última visita por ali andou e nunca mais voltaria.
A casa é isolada, sim. Mas, não a ponto de ser um local de difícil acesso. Erguida numa pequena chácara, tem outras casas por perto, onde vive uma gente feliz e alegre. De modo que não é a casa que afasta as pessoas.
A casa é a grande testemunha da amargurada vida do seu morador - único sobrevivente de uma família, digamos assim: não rica, mas uma família de algumas posses e que, outrora, ali viveu uma vida de felicidades.
Durante o dia não se escutam outras vozes que não a voz do morador, reclamando de um gato amarelo que (esqueci de dizer) também passa por aquela casa, em busca de comida. À noite só o ofegante ronco do morador se escuta.
Isto é, se houvesse alguém para ouvir os sons daquela casa.
A casa é uma bela edificação do século passado e fora, por décadas, não apenas um vibrante lar: era também ponto de encontro de parentes e de muita gente amiga da família. Enfim, era uma casa-festa, um exemplo do bem-receber.
Aquela casa começou perder os seus encantos quando, trinta anos atrás, o patriarca da família morreu vítima de enfarte fulminante. Ao passar do tempo os outros moradores foram morrendo, todos de mortes naturais, restando apenas o morador de hoje:
Um homem que a cada dia fica com a pele mais esverdeada. Um homem de meia-idade, sem ofício de trabalho, e que só anda olhando para o chão. - De onde esse homem tira o seu sustento? - Do pouco que herdou da família junto com aquela casa.
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