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Pescaria, poema de Guimarães Rosa


O peixe no anzol

é kierkegaardiano.
(O pescador não sabe,
só está ufano.)

O caniço é a tese,
a linha é pesquisa:
o pescador pesca
em mangas de camisa.
O rio passa,
por isso é impassível:
o que a água faz
é querer seu nível.

O pescador ao sol,
o peixe no rio:
dos dois, ele só
guarda o sangue frio.
O caniço, então,
se sente infeliz:
é o traço de união
entre dois imbecis…

– João Guimarães Rosa, do livro “Ave, palavra”. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 6ª ed., 2009.

Imagem: Pescando, Almeida Júnior1894


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