Por estradas de montanha
vou: os três burricos que sou.
Será que alguém me acompanha?
Também não sei se é uma ida
ao inverso: se regresso.
Muito é o nada nesta vida.
E, dos três, que eram eu mesmo
ora pois, morreram dois;
fiquei só, andando a esmo.
Mortos, mas, vindo comigo
a pesar. E carregar
a ambos é o meu castigo?
Pois a estrada por onde eu ia
findou. Agora, onde estou?
Já cheguei, e não sabia?
Três vezes terei chegado
eu — o só, que não morreu
e um morto eu de cada lado.
Sendo bem isso, ou então
será: morto o que vivo está.
E os vivos, que longe vão?
– João Guimarães Rosa, do livro “Ave, palavra”. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 6ª ed., 2009.
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