Eu me incomodava que a perfeição da tia Chinwe estivesse determinada pelo que fazia por seu marido
A tia
Chinwe estava linda com um vestido cor de pêssego. “Acho que o Emeka sempre
soube!”, disse com um sorriso. No pescoço usava um colar de coral. Tinha tanta
energia quanto uma atriz de teatro no dia de estreia, cheia de entusiasmo,
nervosa, ansiosa de convencer seu público com a versão de si mesma que ia
mostrar para eles.
Dei ao
tio Emeka o enorme cartão de aniversário que tínhamos comprado e ele me
abraçou. “Como você está crescendo rápido! Em seguida, começarão a chegar os
pretendentes. Mas primeiro eles precisam vir pedir minha permissão!”.
Antes de
cortar o bolo fez um discurso. Disse que a tia Chinwe era sua rainha. Que era
perfeita e que fazia muitos sacrifícios por ele, que sabia exatamente o que ele
queria comer a cada dia, que dava dicas sobre o negócio, e comprava todas as
roupas, e sabia onde estava tudo que ele tinha, e havia dado três filhos
maravilhosos, e decidia tudo da casa, e que ele teve muita sorte.
Os
convidados aplaudiram e comemoraram. Foram ouvidos elogios por toda a sala. A
tia Chinwe foi enterrada em afagos. Estava sorridente e brilhante.
“A esposa
perfeita”, disse uma amiga da minha mãe.
Eu me
incomodava que a perfeição da tia Chinwe estivesse determinada pelo que fazia
por seu marido, não pelo que era. Não dependia de sua inteligência, seu senso
de humor nem de como aplicava bem as injeções. Anos mais tarde descobriria que
nasceu em uma família anglicana, tinha se convertido ao catolicismo para se
casar com o tio Emeka. Transformou-se totalmente para ser a pessoa que ele
queria.
Na noite
da festa houve um acidente. Uma mulher, bêbada por todas as garrafas de
Guinness que tinha bebido, começou a falar coisas para a tia Chinwe. Sobre o
tio Emeka. Sobre o filho de dois anos que tinha com uma garota do Estado de Imo.
Tia Chinwe foi chorar no quarto de hóspedes, nos braços da minha mãe. Parecia
confusa, perdida. Falava muito baixinho. “Não gritei com Emeka”, disse à minha
mãe.
Um tempo
depois, ouvi minha mãe e tia Ngozi falando sobre a tia Chinwe. As duas
concordaram que ela tinha resolvido a situação muito bem. Era o melhor que
podia fazer. Por que brigar e levantar mais poeira?
Tia
Chinwe era um ideal, uma ideia. Talvez minha mãe e outras mulheres que eu
conhecia não eram como ela, mas a idealizavam. Não só aceitavam o que
representava, mas aspiravam a ser como ela. A experiência dela não foi a origem
das perguntas que eu começava a me fazer, mas claro que influenciou bastante. A
vida dela encorajou minhas reflexões.
Por que
deveria ter uma reação contida para que a admirassem? Por que não tinha se
enfurecido com sua humilhação? E se tivesse feito isso, por que não seria
admirável? Para mim parecia algo mais humano, mais sincero. Nunca pediu nada ao
homem que amava, e isso era digno de elogio. Amar era dar, mas amar também devia ser receber.
Por que não pedia nada? Por que não se atrevia? Por que sua perfeição dependia
de não pedir nada?
Pouco
depois da festa, tia Chinwe mudou de nome, de doutora (senhora) Chinwe Nwoye a
doutora (senhora) Chinwe Emeka-Nwoye. Eram os anos noventa, e estava na moda
entre as nigerianas de classe média e alta adotar o nome e sobrenome do marido,
separados por um hífen. Mas me pareceu estranho que a tia Chinwe fizesse isso.
Não era recém-casada, e na sua geração não havia o costume. Era como se sua
resposta à humilhação fosse se apagar ainda mais, afundar-se ainda mais,
mergulhar sem distinção no tio Emeka. Ou dizer ao mundo que, mesmo que ele
tivesse um filho com outra mulher, ela ainda era sua esposa, e ser sua esposa
era o mais importante.
Fonte: El País.
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