Imagem: Armindo Lopes |
Em artigo de primeira página,
ilustrado com duas fotografias, o “Jornal de Angola” informava:
“Ontem, pelas 17 horas, reinava
enorme animação na Feira Popular de Luanda, pois as festividades eram destinadas
aos pioneiros, por ocasião do Dia Mundial da Criança. Milhares e milhares de
crianças da capital tiveram entrada gratuita e divertiam-se, quer com os carrosséis,
baloiços, concursos de natação e pólo aquático, torneios de xadrez, tômbola,
quer com brinquedos improvisados. Várias orquestras actuavam simultaneamente em
sítios diferentes da Feira para dar maior calor e ritmo ao local. Era uma
verdadeira festa para os mais novos que se manifestavam ruidosamente, como só
eles o sabem fazer, marcando o fim próximo do ano escolar, regozijando ainda
mais os que tiveram aproveitamento, compensando, em parte a tristeza dos muitos
– infelizmente – que já não têm hipótese.
“ Foi por essa altura que, junto
do carrossel, onde se concentravam centenas de crianças, um cão furou o cordão
de pioneiros à espera de sua vez e, em ladrar desesperando, atraiu a atenção
sobre si. O cão era da conhecida raça pastor-alemão, também chamado
cão-polícia. E mostrou bem ser justificado o nome da raça. Alguns populares
mais velhos até o quiseram afastar com pontapés. Mas o chão, ao lado do sistema
elétrico do carrossel. Tal foi a confusão e a insistência, que apareceu o serviço-de-ordem.
Um policial avançou para o objeto misterioso e o cão calou-se logo.
“Desembrulhado o pacote, ficou a
descoberto uma bomba-relógio de fabrico caseiro, mas com peças de origem
sul-africana, como se provou mais tarde. Camaradas das Fapla, chamados de
urgência ao local, desmontaram prontamente o engenho, impedindo-o assim de
cumprir a sua macabra missão.
“Com o pânico criado pela
descoberta e dada a confusão gerada, as autoridades fizeram evacuar a Feira,
para procurar outras possíveis bombas. Nada mais se encontrou. Na precipitação
da fuga, ninguém se pôde aperceber para onde tinha ido o cão, desaparecendo
assim sem deixar rasto.
“Mais uma vez a reação criminosa
tentou ceifar vidas inocentes, num claro testemunho de sua barbaridade e do seu
desespero pelo avanço imparável da nossa Revolução Popular. Ninguém ignorava
que a festa era destinada às crianças e
o gesto maquiavélico visava unicamente nossos filhos inocentes.
“As centenas de pioneiros que
poderiam ter sido vítimas dos assassinos e foram salvas pelo instinto maravilhoso
desse cão aproveitam esta página para comovidamente agradecerem ao seu protector
anónimo, que mostrou ser mais humano que os autores do gorado atentado.
“Ao lado, os camaradas das Fapla
já com a bomba desmontada e uma fotógrafa dum cão pastor-alemão, que poderia
ser o do herói do dia se o fotógrafo estivesse lá.”
(O Cão e os Caluandas, Pepetela. Publicações Dom Quixote,Lisboa,3ª ed. 1986, págs.77-79)
Fapla: Forças Armadas Populares para libertação de Angola.
Nota: o blog manteve a grafia original lusitana.
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