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Os Argonautas, poema de Francisca Júlia da Silva


Mar fora, ei-los que vão, cheios de ardor insano;
Os astros e o luar — amigas sentinelas —
Lançam bênçãos de cima às largas caravelas
Que rasgam fortemente a vastidão do oceano.
Ei-los que vão buscar noutras paragens belas
Infindos cabedais de algum tesouro arcano…
E o vento austral que passa, em cóleras, ufano,
Faz palpitar o bojo às retesadas velas.
Novos céus querem ver, miríficas belezas,
Querem também possuir tesouros e riquezas
Como essas naus, que têm galhardetes e mastros…
Ateiam-lhes a febre essas minas supostas…
E, olhos fitos no vácuo, imploram, de mãos postas,
A áurea bênção dos céus e a proteção dos astros…

Francisca Júlia da Silva nasceu na capital paulistana em 1871 e era conhecida como a “musa impassível”. Além de colaborar como jornalista para diversos veículos da época, publicava poemas e acreditava na necessidade do desenvolvimento da literatura destinada às crianças. João Ribeiro, crítico literário da época, duvidava que seus versos pudessem ser creditados a uma mulher. Quando descobriu a verdadeira autoria, impulsionou a publicação do primeiro livro de Francisca Júlia, Mármores (1895). Seu estilo literário voltava-se para um eu-lírico objetivo, rigoroso e, ao mesmo tempo, simbolista e místico. Victor Brecheret a homenageou após seu falecimento com a estátua Musa Impassível que hoje encontra-se na Pinacoteca de São Paulo.


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