para lembrar o que serviu de base ao meu engajamento político: os anos de resistência e o programa elaborado há 66 anos pelo Conselho Nacional de Resistência! Devemos a Jean Moulin, no âmbito desse conselho, a reunião de todos os components da França ocupada, os movimentos, os partidos, os sindicatos, para proclamarem sua adesão à França combatente e ao único chefe que ela reconhecia: o general De Gaulle. De Londres, onde se juntara a De Gaulle em março de 1941, soube que esse Conselho havia organizado um programa e que o tinha adotado em 15 de março de 1944, propondo para a França libertada um conjunto de princípios e de valores sobre os quais se apoiaria a moderna democracia de nosso país.
Mais do que nunca, hoje temos necessidade desses princípios e valores. Precisamos nos manter vigilante, todos juntos, para que esta continue sendo uma sociedade da qual nos orgulhemos; não a sociedade dos imigrantes sem documento, das expulsões, das suspeitas aos imigrantes; não a sociedade na qual sejam questionadas as aposentadorias, os direitos adquiridos da Previdência Social; não a sociedade na qual a mídia está na mão dos ricos - todas essas coisas que teríamos recusado avaliar se fôssemos os verdadeiros herdeiros do Conselhos Nacional da Resistência.
Após um drama cruel, em 1945 houve uma ressureição ambiciosa a que se dedicaram as forças presentes no seio do Conselho da Resistência. Vale lembrar que naquela ocasião foi criada a Seguridade Social, como queria a Resistência, que estipulara expressamente em seu programa: "Um plano completo de Seguridade Social, visando a assegurar meios de existência a todos os cidadãos, em todos os casos em que eles não tenham capacidade de consegui-los pelo trabalho"; uma aposentadoria que permita aos trabalhadores idosos encerrarem dignamente seus dias". As fontes de energia, a eletricidade e o gás, as minas de carvão, os grandes bancos foram nacionalizados. Era o que esse programa também preconizava, o retorno à nação dos meios de produção monopolizados, fruto do trabalho comum, das fontes de energia, das riquezas do subsolo, das companhias de seguro e dos grandes bancos'; a instauração de uma verdadeira democracia econômica e social, implicando a evicção dos grandes feudos econômicos e financeiros que comandam a economia". O interesse geral deve sobrepujar o particular, a justa divisão das riquezas criadas pelo mundo do trabalho deve primar sobre o poder do dinheiro. A Resistência propunha "uma organização racional da economia, assegurando a subordinação dos interesses particulares ao interesse geral, liberado da ditadura profissional instaurada `imagem dos Estados Fascistas', e o Governo provisório da República assegurava a continuidade.
Um verdadeira democracia tem necessidade de uma imprensa independente; a Resist6encia sabia disso, e assim o exigia, defendendo "a liberdade de imprensa, sua honra e sua independência com relação ao Estado, aos poderes do dinheiro e às influências estrangeiras". Era isto o que repetiam os decretos sobre a imprensa, já em 1944. Ora, é isto que hoje está em perigo.
A Resistência apelava para "a possibilidade efetiva, para todas as crianças francesas, de se beneficiarem da educação mais desenvolvida", sem discriminação; ora, as reformas propostas em 2008 vão contra esse projeto. Jovens docentes, cuja ação eu apoio, chegaram a se recusar a aplicá-las, e viram seus salários reduzidos a título de punição. Eles se indignaram, "desobedeceram", julgaram essas reformas muito afastadas do ideal da escola pública, muito a serviço de uma sociedade do dinheiro, e que não mais desenvolve suficientemente o espírito criativo e crítico.
É toda a base das conquistas sociais da Resistência que está sendo agora contestada.
Indignai-vos!, Stéphane Hessel; tradução Marli Peres, São Paulo: Leya -2001
Págs.11-14 - Continua amanhã.
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