início dos tempos até o presente dos fatos. A segunda, “O incidente”, narra os acontecimentos do final de 1963 e dos anos seguintes, durante e após o golpe militar de 1964. Antares começa como o “Povinho da Caveira”, nome dado por um viajante francês que, já naqueles tempos, ali encontra um representante da família Vacariano. Depois da Guerra dos Farrapos, por volta de 1860, aparece o primeiro Campolargo, representando a família rival na disputa pelo controle político do lugar. Os dois clãs viverão em conflito ao longo de gerações. A cidade obtém sua emancipação após a Guerra do Paraguai. Ganham as ruas a campanha abolicionista e a propaganda republicana, em meio a lutas entre as famílias, que sempre tomam partidos opostos. Há mortes e episódios de truculência inominável. Mas Antares muda. Surgem jornais, usina elétrica, automóveis, o futebol conquista o seu lugar. Os filhos das famílias abastadas vão estudar em Porto Alegre. Arma-se o clima para a liderança de Getulio Vargas, que Erico Verissimo convoca para dentro da ficção: em 1925, Vargas consegue um acordo de paz entre os clãs rio-grandeses.
Uma geração de Vacarianos e de Campolargos está morrendo: aquela incapaz de entender o novo pacto protagonizado por Getulio. Entram em cena duas grandes personagens, que, mantendo um pé na antiga herança, esticam o outro para alcançar a margem da modernidade: dona Quitéria Campolargo, mulher enérgica, conservadora mas esclarecida, e o coronel Tibério Vacariano, voluntarioso, reacionário mas afetuoso, sintetizando o melhor e o pior do tipo gauchesco, segundo a visão do próprio autor. Pelos anos 1950 a pequena Antares cresce: recebe multinacionais, e o plantio de soja suplanta a criação de gado. A cidade acompanha a subida de Juscelino Kubitschek ao poder, a fundação de Brasília (que Tibério qualifica com um palavrão), a meteórica carreira de Jânio Quadros e a conturbada posse de João Goulart.
Por fim, chega-se ao golpe de 1964 e a suas consequências: o incidente que dá nome ao livro. No final de 1963 eclode uma greve em Antares, e os grevistas bloqueiam a entrada do cemitério para forçar a negociação. Sete cadáveres ficam insepultos. No dia 13 de dezembro, “por milagre” eles se erguem e marcham para a praça central, exigindo o direito de serem sepultados. Com seu odor pestilencial e o descompromisso com os vivos, trazem literalmente os "podres" da cidade para a luz do dia.
Cia da Letras - sala do professor.
Imagem: Plano Crítico
Comentários
Postar um comentário
comentários ofensivos/ vocabulário de baixo calão/ propagandas não são aprovados.