Mr. Bones sabia que Willy já não ia andar muito tempo neste mundo.
A tosse não o largava havia mais de seis meses e agora é que ele já
não tinha nem a mais remota hipótese de se ver livre dela. Lenta e inexoravelmente, sem nunca dar mostras de abrandar, a coisa ganhara uma vida
própria, avançando de uma vaga farfalheira nos pulmões, cheia de muco,
no dia 3 de Fevereiro, para as convulsões escarrentas e os arquejantes terramotos de monco e pus, no pino do Verão. Tudo isso já era suficientemente
mau, mas, nas duas últimas semanas, infiltrara-se na música brônquica uma
nova tonalidade — uma coisa tensa, silicosa, percussiva — e os ataques
sucediam-se agora com tal frequência que eram quase constantes. Sempre
que um desses ataques começava, Mr. Bones ficava quase à espera que o
corpo de Willy explodisse à mercê daqueles paus de dinamite que rebentavam na sua caixa torácica. Imaginava que o sangue seria o próximo passo.
Quando esse momento fatal finalmente chegou, na tarde de sábado, foi
como se todos os anjos do céu tivessem aberto a boca e desatassem a
cantar. Mr. Bones viu a coisa acontecer com os seus próprios olhos. Estava
parado na berma da estrada entre Washington e Baltimore quando Willy
escarrou dois ou três miseráveis coágulos de matéria vermelha para o seu
lenço e, nesse preciso momento, nessa mesma berma, Mr. Bones ficou a
saber que toda e qualquer réstia de esperança se havia esfumado. O cheiro
da morte cravara-se em Willy G. Christmas e, tão certo como o sol ser uma
lâmpada nas nuvens que se apagava e acendia todos os dias, também o seu
fim ali estava, mesmo ao virar a esquina. (Cia da Letras, 1999, cap. 1pag.7).
Paul Auster é um autor muito conhecido, mas que eu nunca tinha lido. Comecei com Timbuktu uma novela lançada em 1999 que narra a amizade de um cão vira-lata e um poeta indigente. O Clube Errante vai discutir o livro no dia 27 de junho às 20h. O encontro vai ser virtual pelo meet. Sinta-se convidado.
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