Em janeiro li, o que pra mim foi o melhor livro do ano: O Olho da Rua, de Eliane Brum. Jamais tive preconceito com jornalistas e isso já me levou a ler mais alguns livros desses profissionais mais conhecidos na TV e ou revistas. Devo dizer que gostei de todos. Absolutamente diferentes entre si e diferentes, também, do que cada um faz no dia a dia onde são mais conhecidos. Não importa. Todos bons. O mais recente deles: A Vida Que Ninguém Vê me chamou a atenção, porque a autora dá uma aula de história gaúcha, bom humor, lirismo.. tudo a partir de uma estátua. Claro que faz isso nas demais páginas e assuntos, mas comecei abrindo o livro aleatoriamente e...
Ele está lá. Quase ninguém vê, mas está. a maior lição sobre a relatividade do poder. A fugacidade da fama. A efemeridade da glória. Ele, o conde de Porto alegre. Manoel Marques de Souza. terceiro varão de uma dinastia de centauros de espada em riste. Parido na guerra, pela guerra. Engatinhando nas poças de sangue dos campos de batalha, a pele do rosto feita couro pelos ventos do pampa. Aos 13 anos despedindo-se da casa da mãe para se entreverar com os castelhanos. Aristocrata da guerra, virou barão, visconde e por fim um conde, os dois últimos na Guerra do Paraguai. Morreu embebido em dores e feitos, a mortalha bordada de galões e medalhas. E era tão importante, mas tão importante, o nome estendido como um pelego de brios sobre coxilhas do Rio Grande, que mereceu a primeiríssima estátua cravada na mui leal e valorosa Porto Alegre. Título, aliás, que ele conquistou para a capital ao arrancar a cidade dos arcabuzes farrapos.
O ano era 1885. O conde eternizado em mármore. A princesa Isabel em distintíssima pessoa veio instalar o herói na praça que leva o nome do pai, dom Pedro II. e com tal entusiasmo que pode muito bem ter plantado uma pulga no penteado da condessa viúva: "As nobilíssimas condecorações que ornavam o másculo peito, com a ponta de uma fulgurante espada..." e por aí foi o real discurso.
A Vida Que Ninguém Vê
Eliane Brum
Ed.Arquipélago
Páginas: 208
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