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Quem falou do LivroErrante??

Livro só tem sentido se for lido e relido
Publicado em 04.03.2007- Jornal do Commércio - RecifeRENATO MOTA
O hábito de trocar ou emprestar livros é antigo... tão antigo quanto o ato de não devolvê-los. Trocar livros em forma de corrente, atividade realizada geralmente por clubes de leitura, também não é uma coisa lá muito recente. Mas graças aos avanços da tecnologia esse passatempo se expandiu, e o intercâmbio de experiências entre os fãs da leitura pode ser feita em altíssima velocidade, ou melhor, no mínimo a 56 kbytes por segundo.
Usar a internet como forma de organizar a corrente de troca de livros por todo o País é uma atividade que vem ganhando cada vez mais adeptos. Um grande responsável por essa expansão é o site de relacionamentos Orkut. Os internautas se reúnem em comunidades virtuais de acordo com seus assuntos favoritos. A partir daí, pessoas de diversas partes do Brasil que são membros de comunidades relacionadas ao prazer da leitura, como O que você está lendo? e Gostamos de ler, se organizaram para criar uma corrente nacional de troca de livros. Foi o início do Livro Errante.
A idéia partiu de um gaúcho que tinha por hábito abandonar livros em pontos estratégicos da cidade onde mora, com a intenção de que alguém encontrasse a obra, lesse e passasse adiante. Na contracapa vinha a mensagem: “Este livro não pertence a ninguém. É um livro errante. Se caiu em suas mãos, honra-o com tua leitura, e o deixe seguir viagem”. A idéia foi prontamente adotada pela estudante de secretariado Regina Porto, 52 anos. “Eu embalava o livro, deixava todo arrumadinho, e colocava em algum local público de grande movimento. Já abandonei cinco: no Parque 13 de Maio, nos Correios, em Boa Viagem e dois em agências bancárias.”
Histórias como a de Regina empolgaram outras pessoas. A bacharel em Direito Roberta Maroto, 26 anos, se comoveu particularmente com o relato de uma internauta da Bahia. “Ela contou na comunidade que deixou o livro com um telefone de contato anotado, para que quem o encontrasse pudesse comunicar a experiência. Depois de algum tempo, uma pessoa ligou e se disse muito emocionada com esse ato, e que tinha gostado muito da obra. Então a ex-dona do livro pediu para que a pessoa apagasse o telefone dela da página, colocasse o próprio e também o abandonasse”, conta.
O relato deixou Roberta mais corajosa para fazer parte da corrente e tornar errante um dos seus livros favoritos. “Consegui rastreá-lo por um tempo, mas agora já o perdi, não sei onde está”, confessa. É justamente esse sentimento de perda que afastou a maioria das pessoas da comunidade da iniciativa proposta no começo. A partir daí, Regina Porto resolveu organizar uma corrente onde o livro viajaria por todo o País para depois retornar ao seu local de origem.
As regras são simples: cada participante sugere uma obra que tenha à disposição para fazer parte do projeto, geralmente obras de ficção, e deixa na comunidade o nome, autor e uma sinopse para que os outros possam conhecer. Acontece uma votação para decidir quais livros participarão da corrente, e a lista é organizada de forma que a seqüência dos participantes obedeça a proximidade dos seus municípios, para baratear a postagem de cada livro. É marcada uma data para o início da corrente, e decidido um prazo máximo de leitura para os envolvidos. Cada vez que alguém recebe ou envia uma obra, deve comunicar ao organizador, para que este tenha controle sobre o andamento da corrente.
Cada grupo de Livro Errante tem um tema, que determina quais livros serão trocados ou em que ordem eles serão enviados. O primeiro a ser criado foi o Interestadual, que reuniu pessoas de vários Estados brasileiros, em que os livros correram por dois percursos, um de Norte a Sul, outro no sentido inverso. O primeiro, que saiu do Rio Grande do Norte, foi A valsa dos adeuses, de Milan Kundera, e do Rio Grande do Sul partiu O opositor, de Luis Fernando Veríssimo.
No chamado Regional, cada participante escolhia um livro de um autor do seu Estado para repassar para um membro de uma região distante, com o propósito de divulgar os nomes desses escritores. “A idéia principal é recomendar um autor que não seja muito conhecido fora da sua terra”, explica Regina.
Existe até um grupo guiado pelos signos, onde alguém de áries passa o livro para um de touro, câncer e assim por diante. A advogada Laura Paranhos, 40 anos e signo de Escorpião, faz parte desse grupo. “Eu adoro ler e essa é uma oportunidade de conhecer escritores de outras regiões do Brasil ou obras clássicas que não tenha lido”, comenta a advogada, que selecionou Uma varanda sobre o silêncio, de Josué Montelo, para o grupo. Laura ainda afirmou que foi a segurança de receber seu livro de volta que a motivou a participar do Livro Errante. “É preciso haver um controle, pois muita gente tem medo de não receber de volta.”
Atualmente, a comunidade O que você está lendo? seleciona os livros somente escritos por mulheres para o grupo Palavras de Mulher, que deve iniciar a corrente em breve. Não está sendo formada nenhuma corrente nova neste momento, mas Regina explica que, a depender da quantidade de pessoas dispostas, iniciar um novo círculo pode ser bem fácil.
http://jc.uol.com.br/jornal/2007/03/04/not_222387.php

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