- Esse ali é o meu!
E o dedinho apontou, faceiro, o Honda Civic parado na sinaleira. O outro nem bem acompanhou o movimento e já seus olhos brilharam em outra direção.
- E o meu é aquele ali, ó.
E atravessou o braço na direção de uma BMW prata logo atrás do Civic.
O primeiro, que era um pouquinho menor, não se intimidou. Pulou no assento e apontou direto para um Audi A4, todo preto, que vinha na transversal.
- Aquele é meu!
- E aquele é meu! Disse o maior, enquanto apontava a Toyota Hylux que passava rente à janela, logo abaixo deles.
- E aquele é meu! Exultou o menor, apontando uma Mercedes conversível mais adiante.
As mães, no banco de trás, volta e meia largavam o fio da conversa para chamar, sem muito entusiasmo, os dois à ordem.
- Te acomoda, guri.
- Senta direito.
- Te segura, olha a curva.
Mas eles, os olhinhos cada vez mais brilhantes, a disputa cada vez mais acirrada, nem davam ouvidos. A menor distração poderia ser fatal.
Seguiram naquele jogo por um bom tempo ainda, pulando e gritando sem se importar com os solavancos do ônibus lotado, protegidos do sonho por aquela armadura ruidosa e fria de realidade. Então, com um movimento brusco para a direita, o ônibus tomou um caminho menos movimentado, em direção ao bairro, e a brincadeira arrefeceu.
- O meu é aquele ali!
Despertou o maior, num rompante.
E apontou um Celta vermelho que vinha, solitário, na direção oposta.
- Ah, agora não tem mais graça.
Respondeu o outro e encolheu-se no fundo do banco, os olhos perdidos na ruela irregular que cortava o bairro de casebres miseráveis, até chegarem ao fim da linha.
Junho 2008 /cedido pelo autor para o blog
Marcelo: Muito bom. Quando criança, passei tardes sentada na calçada de casa, tagarelando com minha amiga e disputando os carros que passavam pela rua.
ResponderExcluirParabéns!
Marcelo, me lembrei que meus irmãos e eu tínhamos uma brincadeira semelhante. Bons tempos de criança. Parabéns pela publicação! Ladyce
ResponderExcluirMuito bom, simples e nostálgico.
ResponderExcluirMuito bom o texto. Adorei! :)
ResponderExcluirMarcelo, que texto liiiiiindoooo! Parabéns pela singeleza.
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