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Na escola, que é lugar de criança

Bem pouco tempo atrás, Paula Alessandra, 6 anos, passava as tardes sem fazer nada. Ociosa, costumava ficar brincando com os dois irmãos, de 7 e 11 anos, pela ruas da periferia de Arcoverde, no Sertão do estado. Sua mãe costuma sair ainda de madrugada para o matadouro público da cidade, onde trabalha.
O pai, que é mototaxista, também fica ausente a maior parte do dia. Sem nenhum dos dois por perto, a menina e os irmãos acabavam voltando para a escola no dia seguinte sem cumprir as tarefas. Mas a realidade das três crianças está sendo transformada. Desde que foi implantado o regime integral, Paula e outras crianças e adolescentes da comunidade de Tamboril, bairro carente do município sertanejo de Arcoverde, têm a oportunidade de aprender mais. Primeira na região a funcionar com o novo modelo, o Centro de Ensino Integral Ivany Rodrigues Bradley atende a 322 estudantes de 6 a 14 anos. Os alunos chegam às 7h30 e só largam às 17h.
Paula Alessandra é uma delas. Quando começou a frequentar o centro integral tinha dificuldade de concentração e mal reconhecia as letras. "Ela vivia dispersa e não conseguia concluir uma tarefa", lembra a professora Adriana Feitosa. Hoje, Paula já escreve o seu nome e ensaia ler as primeiras palavras. Os irmãos, também alunos do centro, deixaram de ficar na rua. "A gente vê no rosto dessas crianças que elas estão felizes. Para a gente, cada dia é uma vitória", diz a professora.
Segundo a coordenadora do centro, Rejane Rodrigues Verçosa, o sistema integral foi uma forma de atrair os estudantes para a escola. "As crianças ficam mais tempo na escola praticando atividades educativas. No começo, alguns choravam querendo ir para casa, mas agora já se adaptaram", explica. Segundo Rejane, a proposta da escola modelo agradou aos pais das crianças. Tamboril é um bairro conhecido pelos altos índices de criminalidade, inclusive pelo tráfico de drogas. "Os pais tinham medo que as crianças se envolvessem com traficantes", comenta a coordenadora.
Na primeira partedo dia, os alunos têm a carga horária semelhante a qualquer outra escola. No turno da tarde, as crianças passam por aulas de reforço, principalmente aquelas que estão fora da faixa etária. Também aprendem noções de informática, música e artes e fazem aulas de educação física. Durante o período em que permanecem no centro, recebem três refeições, sendo um almoço e dois lanches. "A gente já sente uma melhora no rendimento dos estudantes. Estão mais dispostos e participativos", ressalta.
Para o ano letivo de 2010 a Secretaria de Educação deverá inaugurar o segundo centro de ensino modelo da cidade, que também será localizado em uma área carente de Arcoverde. Serão atendidas 400 crianças do ensino fundamental dos bairros da Boa Vista, Cohab I, Santa Terezinha e São Geraldo. Segundo a secretária de Educação, Cultura e Esporte de Arcoverde, Angélica Patrícia Pacheco, o prédio está em fase de construção. "O novo centro integral terá a mesma estrutura de salas e laboratórios do Centro de Ensino Integral Ivany Rodrigues Bradley, inaugurado no início deste ano". Ela adianta que o centro de ensino integral deverá contar com dez salas de aula, laboratório de informática, biblioteca, área de lazer e refeitório.
(Matéria de Ana Paula Neiva - publicada no Diário de Pernambuco de 21/10/2009
Imagens de: Paulo Cézar Cavalcanti)

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