Sou de uma família nigeriana convencional, de classe média. Meu pai era professor universitário e minha mãe era administradora. Tínhamos, como era comum, empregados domésticos que moravam em nossa casa e que, em geral, vinham de vilarejos rurais próximos. No ano em que fiz oito anos, um menino novo foi trabalhar lá em casa. O nome dele era Fide. A única coisa que minha mãe nos contou sobre ele foi que sua família era muito pobre. Minha mãe mandava inhame, arroz e nossas roupas velhas para eles. Quando eu não comia todo o meu jantar, ela dizia "Coma tudo! Você não sabe que pessoas como a família de Fide não têm nada?" E eu sentia uma enorme pena dele.
Certo sábado, fomos ao vilarejo de Fide fazer uma visita. Sua mãe nos mostrou um cesto de palha pintado com uns desenhos lindos que o irmão dele tinha feito. Fiquei espantada. Não havia me ocorrido quw alguém naquela família pudesse fazer alguma coisa. Eu só tinha ouvido falar sobre como eles eram pobres, entao ficou impossível para mim vê-los como qualquer coisa além de pobres. A pobreza era minha história única deles. (págs. 14-16)
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...Mostre um povo como uma coisa só sem parar e é isso que esse povo se torna |
Primeiro senti uma leve vergonha. Percebi que tinha estado tão mergulhada na cobertura da mídia sobre os mexicanos que eles haviam se tornado uma só coisa na minha mente: o imigrante abjeto. Eu tinha acreditado na história única dos mexicanos e fiquei morrendo de vergonha daquilo.
É assim que se cria uma história única: mostre um povo como uma coisa, uma coisa só, sem parar, e é isso que esse povo se torna. (págs. 21-22)
Nota: grifos do blog.
Em: O Perigo de Uma História Única, Chimamanda Ngozi Adichie. Cia das Letras,2019
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