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Vamos Pensar? Você sabe o que é Guardar?


Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma. 
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la,
isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é,
velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que pássaros sem voos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se
declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

Antônio Cícero Correia Lima -foi um compositor, poeta, crítico literário, filósofo e escritor. Ocupante da cadeira 24  da Academia Brasileira de Letras.  

O acadêmico Antônio Cícero, através de eutanásia faleceu dia 23 de outubro em Zurique.  O autor de vários poemas musicados por sua irmã Marina Lima e autor do poema acima, informou da decisão e se despediu dos amigos em uma carta simples, clara e doce:

Queridos amigos,

Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia.

O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de

Alzheimer.

Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas

no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem.

Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas

pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi.

Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia.

Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu

mais gostava no mundo.

Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha

terrível situação.

A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas – senão a coisa mais importante da minha vida. 

Hoje, do jeito em que me encontro, fico

até com vergonha de reencontrá-los.

Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que

quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo.

Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade.

Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!



 


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