Pular para o conteúdo principal

Descobrindo antigos autores: José J. Veiga. Aquele Mundo de Vasabarros

     Conheça o mundo e a gente de Vasabarros, trazidos até nós por José J. Veiga neste relatório muito fiel sobre aquela comunidade incomparável mas não de todo impossível.  Conheça o S Simpatia D. Estêvão IV, o Mijão, quando mais não seja para evitar passar perto dele caso algum pesadelo nos transporte para lá uma noite.

     Teoricamente o Simpatia é a autoridade máxima do lugar, mas a verdade pura e simples é que esse D. Estêvão não manda muito. Mas ele precisa de um derivativo para essa frustração, e os senescas de Vasabarros, seus ministros, permitem que ele faça alguma coisa: que mende gente humilde para os castigos do tico-tico, do diagrama, do triângulo, da barrica e até da barrica-com-araponga.

     Vale a pena conhecer também o senesca bate-pau Gregóvio, o homem sem pescoço, que toma chá de cavaco, gosta de aplainar tabuinhas de jacarandá e é tão forte que imobiliza um cavalo segurando-o pelo rabo. É preciso ter cuidado com Gregóvio, pois ele é cruel, matreiro e tem um olho nos símbolos do poder. 

     E tem a Simpateca, mulher do Simpatia., que também vive fristrada porque percebeu que o casamento com D. Estêvão foi um erro trágico, mas nada pode fazer para consertar o erro, nem pode mostrar que está sabendo das coisas. A salvação de Simpateca é a excentricidade planejada, a irreverência contra o Simpatia e o gosto por árias de óperas.

     Enquanto as realidades do poder se manifestam, os dois filhos do casal real - Andreu,o futuro Simpati, e Magnólia, a princesa triste -passeiam sua inocência e sua perplexidade pelos corredores e porões de Vasabarros, sem compreender o que fazem ali, nem porque aquilo existe.

     Do outro lado de espectro estão o senesca Zinibaldo, homem correto e idealista; o menino Genísio, pivô involuntário de um episódio momentoso; os conspiradores do Quilombo do Calabouço; Benjó, o cavalariço apaixonado por um par de botas vermelhas.

     A história aqui relatada, mero episódio de longa crônica d Vasabarros e de sua dinastia, começa num dia de cerimônia anual do Enxoto da Aranhas, no simpatiado de D. Estêvão IV, que corresponde mais ou menos aos anos 60-70 de nosso sóculo e termina com a gravidez d Magnólia, ou melhor, se interrompe, porque nenhuma história termina jamais; apenas muda de rumo, ou de cenário, ou de personagens. 

     Divirtam-se então com a história de Vasabarros e sua gente, mas sem esuecer que se trata de uma história passada em outra dimensão que não a nossa. Graças a Deus nada temos a ver com aquele mundo distante, obsoleto e anacrônico.

Orelhas da edição de 1983. Ed. Difel, São Paulo


Aquele Mundo de Vasabarros José J. Veiga. Editora Difel, São Paulo 1983.

Carumbá (GO) 1915 <-> Rio de Janeiro (RJ) 1999

Comentários

  1. Goiano! Nosso orgulho. Leia também o de contos, um pouco difícil de entrar mas depois a gente pega, Os cavalinhos de Patiplanto. O próximo dele q vou ler é A hora dos ruminantes.
    Beijo, Rê.
    Ass. Natascha

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá, Natascha. Gostei dessa distopia de José J. Veiga. Tenho A Hora dos Ruminantes que você indicou. Está na fila para leitura. Obrigada pela participação.

      Excluir

Postar um comentário

comentários ofensivos/ vocabulário de baixo calão/ propagandas não são aprovados.

Postagens mais visitadas deste blog

A Beleza Total, Carlos Drummond de Andrade.

A beleza de Gertrudes fascinava todo mundo e a própria Gertrudes. Os espelhos pasmavam diante de seu rosto, recusando-se a refletir as pessoas da casa e muito menos as visitas. Não ousavam abranger o corpo inteiro de Gertrudes. Era impossível, de tão belo, e o espelho do banheiro, que se atreveu a isto, partiu-se em mil estilhaços. A moça já não podia sair à rua, pois os veículos paravam à revelia dos condutores, e estes, por sua vez, perdiam toda a capacidade de ação. Houve um engarrafamento monstro, que durou uma semana, embora Gertrudes houvesse voltado logo para casa. O Senado aprovou lei de emergência, proibindo Gertrudes de chegar à janela. A moça vivia confinada num salão em que só penetrava sua mãe, pois o mordomo se suicidara com uma foto de Gertrudes sobre o peito. Gertrudes não podia fazer nada. Nascera assim, este era o seu destino fatal: a extrema beleza. E era feliz, sabendo-se incomparável. Por falta de ar puro, acabou sem condições de vida, e um di

Mãe É Quem Fica, Bruna Estrela

           Mãe é quem fica. Depois que todos vão. Depois que a luz apaga. Depois que todos dormem. Mãe fica.      Às vezes não fica em presença física. Mas mãe sempre fica. Uma vez que você tenha um filho, nunca mais seu coração estará inteiramente onde você estiver. Uma parte sempre fica.      Fica neles. Se eles comeram. Se dormiram na hora certa. Se brincaram como deveriam. Se a professora da escola é gentil. Se o amiguinho parou de bater. Se o pai lembrou de dar o remédio.      Mãe fica. Fica entalada no escorregador do espaço kids, pra brincar com a cria. Fica espremida no canto da cama de madrugada pra se certificar que a tosse melhorou. Fica com o resto da comida do filho, pra não perder mais tempo cozinhando.      É quando a gente fica que nasce a mãe. Na presença inteira. No olhar atento. Nos braços que embalam. No colo que acolhe.      Mãe é quem fica. Quando o chão some sob os pés. Quando todo mundo vai embora.      Quando as certezas se desfazem. Mãe

Presepe, Manoel Bandeira

Chorava o menino. Para a mãe, coitada, Jesus pequenito, De qualquer maneira (Mães o sabem…), era Das entranhas dela O fruto bendito. José, seu marido, Ah esse aceitava, Carpinteiro simples, O que Deus mandava. Conhecia o filho A que vinha neste Mundo tão bonito, Tão mal habitado? Não que ele temesse O humano flagício: O fel e o vinagre, Escárnios, açoites, O lenho nos ombros, A lança na ilharga, A morte na cruz. Mais do que tudo isso O amedrontaria A dor de ser homem, O horror de ser homem, — Esse bicho estranho Que desarrazoa Muito presumido De sua razão; — Esse bicho estranho Que se agita em vão; Que tudo deseja, Sabendo que tudo É o mesmo que nada; — Esse bicho estranho Que tortura os que ama; Que até mata, estúpido, Ao seu semelhante No ilusivo intento De fazer o bem! Os anjos cantavam Que o menino viera Para redimir O homem — essa absurda Imagem de Deus! Mas o jumentinho, Tão manso e calado Naquele inefável, Divino momento, Esse bem sabia Que inútil seria Todo o sofrimento No Siné