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Congresso Internacional do Medo,Carlos Drummondo de Andrade


 Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaemos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai, nosso 
                                                          [companheiro,
o medo grande  dos sertões, dos mares, dos desertos, 
o medo dos soldados , o medo das mães, o medo das
                                                          [igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos 
                                                          [democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois
                                                          [ da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e
                                                          [ medrosas.

(Sentimento do Mundo - 1940)

Comentários

  1. Olá, agradeço pela visita ao meu blog. Aqui estou eu visitando o seu... Muito bacana, por sinal. Viva o poeta Drummond. Abraço.

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