Algo havia mudado em mim; uma cumplicidade com o peixe, com a vida, a humildade de ser apenas uma criatura dividindo o mesmo planeta com tantas outras. Homens, animais, todos lutamos pela sobrevivência. A natureza não sabe. Mas nós sabemos, ou deveríamos saber, nos declarndo Homo Sapiens literalmwnte "homem sábio". Onde encontramos essa sabedoria? No modo como dividimos o mundo com outras criaturas? Onde está a sabedoria quando matamos um leão ou um elefante a tiros, quando matamos um tubarão ou salmão por divertimento, para nos vangloriat, como se fossem troféus? Quais os valores morais que guiam o dedo que puxa o gatilho ou arranca o peixe da água? Existem muitas formas de concretizar os nossos desejos e impulsos, de buscar por grandes realizações e descobertas, que não envolvem a matança de vidas inocentes. Existem muitas formas de nos aproximar da Natureza sem mutilar suas criações.
Sempre soube disso, mas achava que soltar o peixe era suficiente , que o ato demonstrava uma postura mais bondosa com a vida e a Natureza. Estava errado. Se soltar o peixe funcionasse para sustentar a população nos rios, a gigantesca indústria de estocagem não seria necessária. Os recursos usados para a criação de peixes em viveiros dedicados à pesca amadora ilustram dramaticamente o desequilíbrio da nossa relação com os rios que tanto amamos.
Antes de voltar para o quarto, o Sol baixo, caminhei até a beira do rio. Como se por mágica, vi uma truta enorme pular atrás de uma efemérida; a simples beleza do inesperado. Era uma despedida. Lembrei das palavras de Luca, meu guia na Toscana, dizendo que que a pesca noturna era a forma mais pura de pesca, instinto misturado com poesia. uma união com o rio, com seus sons, com as trutas. Naquele momento, entendi que podia experimentar tudo isso sem uma vara de pesca na mão, sem intenção de fisgar um peixe. Foi então que as paredes do monastério desapareceram e entendi que o templo é o mundo.
Em: A Simples Beleza do Inesperado, Marcelo Gleiser, ed.Record 2019, págs. 191-192
Recomendo a leitura do livro. O cientista Marcelo Gleiser, com muita franqueza e de forma simples e didática faz a gente refletir sobre a natureza e mais ainda sobre nossa relação arrogante, agressiva e irresponsável com ela. O exemplar está disponível para o grupo Livro Errante
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