Na copa do mundo de 2014, aquela do vergonhoso 7 x 1,
li, não lembro onde, matéria que trazia a opinião de alguns turistas sobre nós
os brasileiros. Memorizei algumas e o fato de que nenhum viu naquele momento
algo que tenha considerado absurdo. Um dos turistas nos achou severos demais,
pessimistas. Isso por ter ouvido com frequência: É Brasil! Só acontece no Brasil!
etc. Que, admitamos, dizemos como um mantra como se nós não fizéssemos parte do
pacote verde amarelo.
O espanto da correspondente americana (vinda da França) em relação às meias usadas pelas cariocas: “aquilo que me deixou mais desconcertada
quando cheguei ao BR, depois de alguns anos em Paris, foram as meias. Não
conseguia perceber a razão...” (pag. 11) foi o mesmo que tive lendo a matéria.
E sou brasileira de uma cidade ensolarada como o Rio de Janeiro.
Agora, no ano em que vamos novamente participar de uma
copa do mundo, dessa vez na Rússia, me lembrei da severidade apontada pelo
turista, quando eu mesma conversando com um motorista de Uber, falei que as
outras estações de BRT* do Recife e região metropolitana só ficarão prontas na
próxima copa. Nos dois não sabíamos onde seria a próxima. ** O que diria de nós
o gringo que nos classificou de pessimistas e severos se nós ouvisse calcular o
tempo por copa do mundo?
Pois bem, neste ano da graça da copa da Rússia comprei um livro
bem interessante que traz a opinião de
alguns correspondentes estrangeiros.
Comprei porque me interessa saber a visão de outra pessoa. O
correspondente, ao contrário do turista, mora no pais. Diferente do turista, o
correspondente vive o que o nativo vive no Brasil: usa nosso sistema de transporte público
conhecendo o de seu pais e o dos outros por onde passou, faz compra em shopping
e comércio popular mas com o sotaque denunciador e atraente pro desonesto e
assim vai.
Palavra de Gringo, um olhar estrangeiro sobre o Brasil.
Org. Hugo Goncalves, ilustração Rita Wainer, tradução Hugo Gonçalves...( et.
Al) – 1 ed. – Rio de Janeiro, Língua Geral 2014.
Leitura interessante porque de forma crítica e muitas vezes bem
humorada, 10 correspondentes estrangeiros falam do que lhes chamou a atenção. O pais do livro está reduzido a Rio de Janeiro,São
Paulo e Brasília porque é onde acontecem
os eventos e decisões que movem o Brasil e, logicamente, para onde vai a
imprensa do mundo. Mas isso não faz as narrações ficarem menos interessantes e
relevantes para quem não é ou mora nessas cidades. Ao contrário, até ajuda o nativo saber sobre
o brasileiro que não tem o seu sotaque.
Para trás ficaram as Garotas de Ipanema, substituidas
por fisiculturistas com coxas tão musculosas como as de um jogador de
futebol. (pag.13)
Mais adiante
entra o correspondente alemão que relata a história verdadeira de uma mulher
negra e pobre. Afinal, ele, Philip, veio para o Brasil porque: “... Lia-se que o Brasil não era mais o eterno pais do futuro, mas sim,
finalmente, o pais do presente: mais seguro, mais democrático, mais humano. E
que, finalmente, as coisas estavam se mexendo também no Rio. Que a cidade, um
Brasil em miniatura, tornara-se mais segura. Que estava sendo arrumada para a
Copa e as Olimpíadas e que havia regras para tudo, até para abrir um coco. Um
revista alemã chegou a escrever que o Rio estava ficando enfadonho.” ( Pag.
23). O alemão veio com uma ideia
otimista aprendida no exterior, depara-se com um cenário diferente do anunciado
e conhece uma história de superação de uma pessoa que , seguindo a linha comum
de seus pares, no nosso pais, não faria sucesso. Mariana é uma contradição dentro do pais que
Philip não encontrou e dentro do pais que nós conhecemos.
O Brasil é
uma sociedade presa em suas estruturas coloniais, com uma elite blindada contra
invasores ou ideias inovadoras. (pag. 32).
A partir da leitura desse livro entendi melhor a
critica que há alguns anos me fez um jornalista colombiano. Ele me disse que
somos fechados para os hermanos da A.L e desconfiava que tínhamos esse
comportamento entre nós mesmos. E no que
diz respeito à desconfiança dele acabo
concordando.
Carregados de preconceito, nos fechamos em regiões, sotaques,
etnias e sei lá mais o quê, o que resulta num desconhecimento da nação como um
todo. E sobre isso, a nossa ignorância está pesquisada e divulgada publicamente
na Revista Super Interessante .
Recomendo a leitura do livro e da matéria.
*O sistema de transporte por BRT
deveria ficar totalmente instalado antes da Copa do Mundo do Brasil em 2014.
Porém, somente depois de forma improvisada, precária e reduzida é que entrou em operação. Diversas estações
ainda não foram construidas ou acabadas até hoje.
** Próxima copa do Mundo, em 2021 vai ser no
Qatar
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