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Comentando: Duas Postagens e Uma Queixa: a intolerância

     
Na ultima quarta-feira, postei uma  antiga crônica do jornalista Aluízio Falcão.  No texto, o autor  se diz intolerante à intolerância, o que justificou a praga que, mentalmente, jogou contra um casal que vinha falando mal de nordestinos quando cruzou com ele num parque em São Paulo.  
     A crônica, bem redigida, traz a situação muito  (crescente?) frequente  da intolerância ao diferente. Naquele caso, o diferente era ser nordestino. O casal vítima da praga não conseguia admitir algo fora do que determinou pra si como aceitável. Para os intolerantes do parque quem não puder ser identificado como paulistano, precisa ser afastado de seu campo de visão. Uma lástima!! 
     Na mesma quarta-feira, o blog da jornalista Suzana Valença trouxe uma matéria interessantíssima sobre identidade. Na verdade sobre determinar e ou fechar-se numa identidade. 
    
A jornalista quer falar sobre polarização, mas  trouxe antes  uma matéria com Johnnetta Cole, diretora do Museu Nacional de Arte Afro Americana sobre identidade.  Achei bastante interessante a ideia de Johnnetta porque ela me levou a pensar na causa da irritação do casal do parque: identidade. Na verdade, o erro em achar que cada pessoa só tem uma identidade, ou o erro de enclausurar o outro numa identidade escolhendo justamente a que nos desagrada ou sobre a qual somos mais ignorantes. E, assim sendo e agindo, caímos no que virou um problema tanto no Brasil quanto nos USA: polarização. O nós e eles. Sobre o que Suzana Valença vai falar mais adiante.
     Para o autor da crônica, Aluízio Falcão, só cabe a identidade de nordestino (genérica, até!) segundo o outro caminhante do parque. Embora ambos, paulistano e pernambucano, se vistos sob a ótica da diretora do museu, tivessem identidades comuns: moradores de SP, apreciadores de caminhadas, talvez o mesmo time de futebol, ao jovem do casal só cabia olhar para Aluízio como olhou para Erundina: como pessoas que nunca deviam ter saído de sua região. Nós (paulistano) eles (Aluizio e Erundina), uma polarização. 
     Já estamos, desde há muito, no tempo de deixar de lado tamanha demonstração de ignorância e má vontade. Enclausurar o outro numa única identidade é pobre e perigoso. Dividir as pessoas em nós e eles é pobre e perigoso, fechar-se numa identidade só, é pobre e perigoso. Intolerância, enfim, é igualmente pobre e perigoso.
     Ser múltiplo é muito melhor, é mais sábio, mais rico, mais simpático. A vida cobra atitudes de acolhimento, aceitação, inclusão. Não temos mais tempo a perder rogando pragas.


Leia a matéria no blog de Suzana Valença
Leia a crônica de Aluízio Falcão. 
Especialista em Comunicação Estratégica e Mídias Digitais: Contratre

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